Exclusão do ICMS de PIS/Pasep e Cofins: efeitos sobre decisões anteriores desfavoráveis

Exclusão do ICMS de PIS/Pasep e Cofins: efeitos sobre decisões anteriores desfavoráveis

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No dia 17 de julho deste ano, a Receita Federal do Brasil (RFB) publicou na Solução de Consulta (SC) 206/2024 de sua Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), o entendimento de que o “Contribuinte que tenha em seu desfavor decisão judicial transitada em julgado no sentido de manter o ICMS na base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep, anteriormente ao julgamento do RE nº 574.706/PR pelo STF, pode, a partir de 16/03/2017, pleitear administrativamente sua exclusão”. 

O entendimento adotado pela RFB foi o de que, em relações tributárias continuativas ou de trato sucessivo – ou seja, relações que “se renovam” a cada fato gerador –, uma decisão judicial vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) pode alterar o contexto dessa relação. Com isso, qualquer outra decisão judicial que regulasse essa situação deixaria automaticamente de produzir seus efeitos. 

Contudo, embora esse entendimento esteja agora sendo aplicado em favor dos contribuintes, ele se insere em um contexto mais amplo defendido pelos órgãos de fiscalização e arrecadação, que, em geral, tendem a adotar uma posição contrária aos contribuintes, como veremos a seguir. 

Contexto da exclusão do ICMS das bases de cálculo de PIS/PASEP e Cofins 

Neste artigo publicado no blog da BLB, foi abordada a chamada “relativização da coisa julgada” pelo STF. Basicamente, essa relativização refere-se à decisão do Tribunal de que, mesmo um contribuinte tendo obtido na Justiça o direito de não pagar determinado tributo, ele perderá automaticamente esse direito se o STF, posteriormente, entender que a cobrança é devida. 

Um dos efeitos imediatos dessa decisão foi o questionamento, por parte da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), das decisões favoráveis obtidas pelos contribuintes sobre a “tese do século” (exclusão do ICMS das bases de cálculo de PIS e Cofins), como discutido no artigo “PGFN pode questionar ‘tese do século’ após 15 de março de 2017?”. 

A PGFN passou a questionar as decisões favoráveis que permitiam a recuperação de créditos do passado por contribuintes, emitidas após o julgamento em repercussão geral pelo STF em 15 de março de 2017, mas antes da modulação dos efeitos estabelecida pelo mesmo Tribunal em 13 de maio de 2021, que apenas os contribuintes que já tivessem ajuizado ações até 15 de março de 2017 poderiam recuperar créditos anteriores a essa data. 

De acordo com a decisão do STF sobre a “coisa julgada”, a qual prevê que as decisões do Tribunal em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos de decisões transitadas em julgado nas relações de trato sucessivo, a PGFN entendeu que a modulação dos efeitos no julgamento da “tese do século” deveria interromper automaticamente os efeitos das decisões obtidas pelos contribuintes. Essas decisões, proferidas após 15 de março de 2017, autorizavam a recuperação de créditos anteriores a essa data. 

Além disso, a PGFN contou com uma inovação introduzida na legislação pelo Código de Processo Civil (CPC), que entrou em vigor em 16 de março de 2016 (Lei 13.105/15). Tal atualização estabelece que o prazo para propor uma ação com o objetivo de rescindir uma decisão judicial anterior comece a contar a partir da data do trânsito em julgado de uma decisão do STF, especialmente em casos de repercussão geral. 

Na prática, basicamente, isso fez com que a RFB e a PGFN adotassem dois procedimentos em relação a esses créditos do passado: 

  1. propositura de ação rescisória contra contribuintes que já utilizaram o crédito, ou que ainda não utilizaram nem pediram a utilização do crédito; 
  2. indeferimento da utilização do crédito por contribuintes que já haviam pedido, mas ainda não começaram a utilizar o crédito. 

A crítica feita na época apontava que tanto a possibilidade de propor uma ação rescisória com prazo iniciando apenas após o trânsito em julgado da decisão do STF quanto a cessação automática de efeitos da coisa julgada de uma decisão judicial violam a segurança jurídica por uma questão de coerência do sistema jurídico. Isto é, mesmo decisões que venham a ser posteriormente consideradas contrárias à Constituição são protegidas pela própria Constituição durante todo o tempo em que produziram seus efeitos, conferindo, assim, estabilidade ao sistema jurídico-constitucional. 

Essa crítica leva em consideração dois pressupostos da própria Constituição: a sua “supremacia”, que estabelece a Constituição como o fundamento de validade de todas as demais normas, e a sua “unidade”, que reconhece que as normas do sistema jurídico existem em relação às demais. Por meio dos pressupostos de “supremacia” e “unidade”, a Constituição efetiva a segurança ao proteger até mesmo os efeitos de normas que, eventualmente, possam ser contrárias a ela, enquanto o sistema jurídico prescreve mecanismos próprios para que as normas possam iniciar e cessar seus efeitos.  

Apesar dessa crítica, o entendimento da RFB na SC Cosit 206/24 é coerente com os posicionamentos anteriores do órgão, permitindo que os contribuintes se beneficiem de uma decisão mais favorável, mesmo que tenham recebido uma deliberação desfavorável antes do parecer definitivo do STF. Vale destacar que esse cenário de decisões definitivas em temas de repercussão geral é raro, visto que, após o reconhecimento da repercussão, a tendência é que as ações sobre o tema fiquem sobrestadas até o julgamento pelo STF.  

Conclusão 

A SC Cosit 206/24 da RFB reafirma o entendimento dos órgãos de fiscalização e arrecadação de que relações de trato sucessivo estão sujeitas à mudança automática a partir de decisões vinculantes dos órgãos do Poder Judiciário – para o bem ou para o mal, pelo menos no caso da “tese do século”. 

Nesses casos específicos, e em outras situações que envolvam discussões jurídico-tributárias, o que se tem é a necessidade de os contribuintes adotarem uma postura mais estratégica, integrando os entendimentos e as práticas de seu departamento fiscal com um conhecimento mais amplo do andamento dessas discussões no Poder Judiciário. 

Considerando todos esses pontos, a BLB Auditores e Consultores, especializada em garantir confiabilidade e segurança nos negócios e nos controles de seus clientes, conta com profissionais altamente capacitados no âmbito tributário. Podemos auxiliar você e sua equipe na obtenção de soluções específicas para o seu negócio. Entre em contato conosco! 

Autoria de Pedro Magalhães e revisão técnica de Paulo Martesi
Consultoria Tributária
BLB Auditores e Consultores 

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