Acompanhe o embasamento teórico que faz as renegociações de dívidas com devedores inadimplentes serem uma relevante oportunidade para a redução das despesas tributárias: não incidência de PIS e Cofins.
O dilema da definição de receita e seus efeitos
Desde a Emenda Constitucional nº 20/1998, que foi responsável por, entre outras questões, inserir na Carta Magna a contribuição social sobre a receita ou o faturamento, muito tem se discutido acerca da definição desses dois termos. Isso se justifica devido ao fato de afetarem diretamente a mensuração dos respectivos tributos, a saber: a contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal (STF) exerceu um papel determinante quanto à definição de receita/faturamento ao julgar o Recurso Extraordinário 574.706/PR. Naquela ocasião, foi estabelecido que a contribuição ao PIS e a Cofins não incidem sobre valores correspondentes ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).
Além da tese final fixada pela Suprema Corte, também foi definido naquele momento que “Quanto ao conteúdo específico do conceito constitucional, a receita bruta pode ser definida como ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições[1]”.
Essa definição abriu margem para inúmeros outros questionamentos tributários, dando causa às mais diversas “teses filhotes” que questionam a incidência de tributos sobre tributos. Porém, ao mesmo tempo, também fortaleceu a delimitação da base de cálculo da contribuição ao PIS e a Cofins, permitindo o aperfeiçoamento da mensuração dos valores efetivamente devidos ao Fisco.
Neste sentido, recentemente o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) travou um debate a respeito da incidência ou não de contribuição ao PIS e de Cofins sobre descontos concedidos em renegociações de dívidas. Para isso, partiu-se da premissa de que eles “não possuem natureza jurídica e contábil de receita”, favorecendo os contribuintes nos autos do processo administrativo fiscal nº 16327.720173/2020-57, cuja temática será objeto do presente artigo.
Da relação entre a contribuição ao PIS e a Cofins com descontos: complicações decorrentes do regime de competência
Não é de hoje que se percebe, nos âmbitos administrativo e judicial, intensos debates a respeito da relação entre as contribuições analisadas no presente artigo e os valores concedidos a título de desconto pelos respectivos contribuintes.
Na realidade, as próprias legislações responsáveis por disciplinar a contribuição ao PIS e a Cofins (Leis 10.637/2002 e 10.833/2003), já trilhando o entendimento da incompatibilidade entre os termos “desconto” e “receita”, previram não integrar a base de cálculo desses tributos os valores referentes às “vendas canceladas e aos descontos incondicionais concedidos”.
A referida incompatibilidade figura como motivo de teses tributárias, como a não incidência de contribuição ao PIS e de Cofins sobre valores recebidos a título de bonificações em mercadorias, uma vez que, por possuírem natureza de desconto, não podem ser encaradas como receita.
Como pode ser observado, esse tema representa um debate muito relevante, tendo como precedente favorável aos contribuintes o acórdão proferido nos autos do Recurso Especial 1.836.082/SE.
Contudo, esse assunto ainda gera controvérsias a respeito de ser ou não condicional o desconto recebido pelos varejistas e até mesmo de as bonificações terem natureza de remuneração por serviços prestados aos respectivos fornecedores.
Quando, todavia, o enfoque passa a ser o desconto concedido, por mera liberalidade, a devedores inadimplentes, toda a controvérsia apontada acima quanto à incompatibilidade com a definição de receita bruta parece dissipar-se, de modo que tais valores não devem se submeter à incidência de contribuição ao PIS e de Cofins.
Para fins didáticos, é importante esclarecer que os descontos aqui tratados correspondem a valores aos quais determinada empresa, vendedora ou prestadora de serviços, renuncia em um negócio jurídico, com o objetivo de estimular a quitação pelo devedor que já se encontra em situação evidente de inadimplemento. Busca-se, em síntese, mitigar um prejuízo financeiro, considerando que, entre receber nada ou receber menos do que fora então pactuado, mostra-se mais viável a segunda opção.
Embora a priori pareça facilmente atingível a conclusão de que o contribuinte não deve apurar sua receita bruta considerando valores que sequer recebeu, as questões contábeis inerentes à apuração de tributos acabam por obscurecer essa temática e ocasionar litígios fiscais.
O que é regime de competência?
Neste sentido, para compreender o assunto abordado no presente artigo, mostra-se necessária uma singela ponderação a respeito do que é o regime de competência e de quais são os seus efeitos, visto que é em decorrência dele que a contribuição ao PIS e a Cofins acaba por incidir sobre descontos concedidos a devedores inadimplentes.
De acordo com o art. 177 da Lei nº 6.404/1976, denominada de Lei das Sociedades Anônimas, as escriturações das empresas devem ser mantidas “em registros permanentes, com obediência aos preceitos da legislação comercial e desta Lei e aos princípios de contabilidade geralmente aceitos, devendo observar métodos ou critérios contábeis uniformes no tempo e registrar as mutações patrimoniais segundo o regime de competência” (grifos nossos).
Já o regime de competência consiste em um método que, opondo-se ao regime de caixa, “reflete os efeitos de transações e outros eventos e circunstâncias sobre reivindicações e recursos econômicos da entidade que reporta nos períodos em que esses efeitos ocorrem, mesmo que os pagamentos e recebimentos à vista resultantes ocorram em período diferente” (item 1.17 do Pronunciamento Técnico CPC 00).
Em síntese, enquanto no regime de caixa as receitas e as despesas são reconhecidas apenas quando efetivamente alteram a situação patrimonial dos contribuintes (isto é, quando há efetiva entrada ou saída de valores), no regime de competência as receitas e as despesas são reconhecidas no momento em que determinada operação comercial é pactuada, independentemente da entrada ou da saída de valores dos cofres de determinada entidade.
Em decorrência do regime de competência, quando uma operação é realizada pelo contribuinte, ele deve reconhecer imediatamente essa receita ou despesa, mesmo que a efetiva entrada ou saída de valores venha a ocorrer, por motivos contratuais, em momento futuro.
Assim, sendo a contribuição ao PIS e a Cofins tributos apurados mensalmente, torna-se frequente o cenário no qual as bases de cálculo são apuradas considerando valores que sequer ingressaram nos cofres do contribuinte (ou dele ainda não saíram), haja vista ser de praxe a ocorrência de operações de venda a prazo.
Em outras palavras, o contribuinte fornece ao seu cliente o bem ou o serviço inerente ao seu objeto social, mas não recebe imediatamente a contraprestação dessa operação, por ter concedido contratualmente um prazo para o pagamento. Neste cenário, que precede o efetivo recebimento de valores, há apenas a expectativa de que a avença firmada junto ao cliente será honrada. Independentemente disso, por força do regime de competência, os numerários inerentes a essa operação devem ser contabilizados como receita para fins da incidência da contribuição ao PIS e da Cofins.
E quando não há o pagamento pelo produto ou serviço contratado?
O que acontece, entretanto, se o comprador/tomador não honrar com os valores pactuados no momento do fornecimento da mercadoria ou do serviço? Nessa hipótese, considerando que a receita foi reconhecida antes mesmo de provocar a efetiva alteração patrimonial em favor do contribuinte, tem-se, por decorrência lógica, que ela já sofreu a incidência da contribuição ao PIS e da Cofins.
Ocorre que, conforme tratado anteriormente, a receita pressupõe um “ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições[2]”, o que definitivamente não ocorre quando há inadimplência por parte do comprador/tomador.
É certo que essa inadimplência pode ser repentinamente sanada, ocorrendo, assim, o fenômeno tributável pelas contribuições em comento: receita. Contudo, é frequente a concessão de descontos para devedores inadimplentes, como forma de estímulo à quitação da avença e, principalmente, para a geração de caixa ou quaisquer outros objetivos empresariais.
Nessa hipótese, o fenômeno tributável via contribuição ao PIS e Cofins ocorre de forma parcial, isto é, em quantia inferior ao que foi reconhecido como receita por força do regime de competência, ficando extinta a avença e definida numericamente a receita advinda da operação em questão.
Trata-se de um cenário no qual ocorre a extinção do negócio jurídico pactuado entre comprador/vendedor ou prestador/tomador. Nesse contexto, ao credor não mais subsistirá a prerrogativa de exigir quaisquer quantias do devedor, independentemente de ter submetido à incidência da contribuição ao PIS e à Cofins a totalidade do valor do contrato. Isso porque, ao conceder o desconto visando à quitação da avença, o credor concorda em receber um valor menor pela mercadoria ou pelo serviço entregue ao devedor, liberando-o caso ele efetue o pagamento reduzido.
Nesse sentido, Carlos Roberto Gonçalves ensina que “O cumprimento da prestação libera o devedor e satisfaz o credor. Este é o meio normal de extinção do contrato. Comprova-se o pagamento pela quitação fornecida pelo credor, observados os requisitos exigidos no art. 320 do Código Civil[3]”.
Ou seja, ao liberar o devedor mediante o pagamento da quantia pactuada após a concessão do desconto, não haverá mais qualquer possibilidade de ingresso, nos caixas da empresa então credora, do valor orginalmente acordado para essa operação. Desse modo, por conta do regime de competência, nem tudo o que foi submetido à incidência de contribuição ao PIS e de Cofins efetivamente se concretizou (e nem tampouco se concretizará) como receita.
Nesse ponto é que se torna injusta a impossibilidade de reverter, de algum modo, a tributação de PIS e de Cofins sobre o valor total da avença, haja vista que parte dessa quantia não se concretizou como receita. Assim, considerando esses e outros pontos, o Carf julgou o processo administrativo fiscal nº 16327.720173/2020-57, que será objeto de análise no tópico subsequente.
O entendimento do Carf sobre descontos concedidos em renegociações de dívidas
No final do ano de 2023, mais especificamente no mês de novembro, foi publicado o acórdão do Carf a respeito de descontos concedidos a devedores inadimplentes. Trata-se do processo administrativo fiscal nº 16327.720173/2020-57, cuja origem consiste em retificações de Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF), por meio das quais determinada empresa reduziu o valor devido a título de contribuição ao PIS e de Cofins mediante dedução de descontos concedidos a clientes inadimplentes.
Muito embora a companhia envolvida no caso seja uma instituição financeira, que está submetida a diversas normas específicas desse ramo empresarial, muitas premissas admitidas no momento do julgamento têm caráter amplo e genérico, sendo, portanto, aplicáveis aos demais contribuintes.
Em síntese, o Carf decidiu, ao julgar o recurso voluntário interposto nos autos do processo administrativo fiscal nº 16327.720173/2020-57, que “A pactuação da forma de recebimento dos valores acordados constitui forma de composição da transação, motivo pelo qual a definição do montante tributável não pode ser dissociada desse contexto” e que “a redução dos encargos financeiros para os débitos em atraso se enquadra como descontos incondicionais, constando desde logo dos contratos de renegociação”. Eis a seguir a ementa do referido julgado:
“CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL (COFINS) Ano-calendário: 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 RECEITA TRIBUTÁVEL. CONCEITO JURÍDICO. RECEITA PARA FINS DE DEMONSTRAÇÃO DE RESULTADOS. CONCEITO CONTÁBIL. NÃO EQUIVALÊNCIA. O conceito jurídico-constitucional de receita tributável, acolhido pela alínea “b” do inciso I do art. 195 da CF, não se confunde com o conceito contábil. Apesar de a contabilidade elaborada para fins de informação ao mercado, gestão e planejamento das empresas poder ser utilizada como ponto de partida para a determinação da base de cálculo das Contribuições, ela não subordina a tributação. CONCEITO DE RECEITA. EFETIVO INGRESSO PATRIMONIAL NOVO. A pactuação da forma de recebimento dos valores acordados constitui forma de composição da transação, motivo pelo qual a definição do montante tributável não pode ser dissociada desse contexto. Os descontos concedidos não possuem natureza jurídica e contábil de receita passível de tributação pelo PIS e Cofins, posto que não guardam correlação com o conceito vinculado ao efetivo ingresso financeiro positivo ao patrimônio do contribuinte. BASÉ DE CÁLCULO. DESCONTOS. REDUTORES DO ACRÉSCIMO PATRIMONIAL. O desconto incondicional é aquele concedido independente de qualquer condição futura, não sendo necessário que o adquirente pratique ato subsequente ao de compra para a fruição do benefício. No caso vertente, a redução dos encargos financeiros para os débitos em atraso se enquadram como descontos incondicionais, constando desde logo dos contratos de renegociação. As reduções estão previstas no contrato de renegociação e não dependem de evento posterior à emissão desses documentos (Número do processo: 16327.720173/2020-57; Turma: Primeira Turma Ordinária da Quarta Câmara da Terceira Seção; Câmara: Quarta Câmara; Seção: Terceira Seção De Julgamento; Data da sessão: 23/08/2023; Data da publicação: 14/11/2023).”
O relator original do caso foi o conselheiro Arnaldo Diefenthaeler Dornelles, cujo voto (vencido) negava provimento ao recurso voluntário da contribuinte com base nas seguintes alegações:
(1) “desconto deve ser concedido quando da realização do negócio original, fato gerador da obrigação tributária, seja ele uma compra e venda ou uma prestação de serviço”;
(2) “Para que um desconto pudesse ser considerado incondicional para efeitos de exclusão da base de cálculo da Cofins, seria necessário que ele fosse concedido no momento da concretização do negócio […], e não em um momento posterior, como, por exemplo, após o inadimplemento da prestação”;
(3) “os descontos não foram concedidos em função da realização do negócio, fato gerador da obrigação tributária, mas sim para a viabilização do pagamento inadimplido, referente a um negócio anteriormente realizado”;
(4) “a inadimplência faz parte do risco do negócio e, segundo jurisprudência firmada em nossos tribunais, os valores não pagos não podem ser excluídos da base de cálculo das Contribuições”;
Além das premissas apontadas acima, o voto vencido do conselheiro Arnaldo Diefenthaeler Dornelles também analisou a hipótese de o caso não se referir a uma instituição financeira, tendo mantido, ainda assim, o entendimento de que não seria possível a exclusão dos descontos concedidos a devedores inadimplentes:
“Quando estamos diante de uma operação de compra e venda, ou de uma prestação de serviço não financeiro, onde o pagamento não é feito à vista, o que resta após a entrega da mercadoria, ou após a prestação do serviço, é uma dívida (obrigação de pagar), que, a exemplo do que ocorre no negócio explorado pela recorrente, pode ou não ser adimplida no prazo. E não sendo adimplida, as partes poderão renegociá-la, assim como faz a recorrente, sendo que eventuais descontos concedidos não poderão ser excluídos da base de cálculo das Contribuições.”
Apesar do esforço argumentativo do relator do caso sob análise, o seu voto merece certas críticas. Em primeiro lugar, porque não há na legislação qualquer excerto apto a validar a premissa de que, para ser deduzido da base de cálculo da contribuição ao PIS e da Cofins, o “desconto deve ser concedido quando da realização do negócio original”, isto é, não pode ser concedido em momento posterior (como ocorre no caso do inadimplemento de uma venda a prazo).
Em segundo lugar, porque o fato de que “a inadimplência faz parte do risco do negócio” não legitima a incidência de tributos sobre uma suposta manifestação de riqueza que simplesmente não ocorreu. Ora, a Constituição Federal atribui à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios a competência para tributar a ocorrência de determinados fatos que denotam manifestação de riqueza por parte do contribuinte.
No caso de inadimplência, não há qualquer riqueza a ser tributada, de modo que a incidência de quaisquer tributos sobre os respectivos valores seria absolutamente inconstitucional, por violação às competências estabelecidas pela Carta Magna. Afinal, a contribuição ao PIS e a Cofins incidem sobre a receita, fenômeno que não ocorre quando não há qualquer acréscimo patrimonial em favor do contribuinte.
Portanto, haveria inconstitucionalidade também na medida em que, conforme ensina Paulo de Barros Carvalho, “realizar o princípio pré-jurídico da capacidade contributiva absoluta ou objetiva retrata a eleição, pela autoridade legislativa competente, de fatos que ostentem signos de riqueza[4]” (grifos nossos).
Ora, quais sinais de riqueza ostenta um contribuinte que não recebeu pela mercadoria que entregou ou pelo serviço que prestou? Simplesmente nenhum. Logo, não há como admitir a tributação sobre a inadimplência, ainda que ela faça “parte do risco do negócio” – fato esse puramente irrelevante para fins tributários.
Raciocínios como esses levaram a conselheira Carolina Machado Freire Martins a proferir o voto vencedor responsável por dar provimento ao recurso voluntário interposto nos autos do processo administrativo fiscal nº 16327.720173/2020-57. O seu voto está repleto de ponderações muito pertinentes, que merecem ser transcritas por muito enriquecerem o debate sobre o tema aqui tratado:
(1) “como dito, nas contribuições, o montante sobre qual incidirá o tributo alcança o valor efetivamente acrescido ao patrimônio com a prestação do serviço ou fabricação do produto. Logo, se os descontos representam uma diminuição do ingresso financeiro, a receita não foi aferida integralmente. Devem, portanto, ser excluídos da base de cálculo das contribuições”.
(2) “não se pode vincular a adoção do regime de competência à incidência das contribuições, tendo em vista que, como bem pontuado por Rodrigo Schwartz, ‘o objeto da tributação é a operação lastreada pelo lançamento contábil, e não o registro’”;
(3) “Exigir o reconhecimento da receita acontece na data em que foi firmado um contrato, não pode significar exigir do contribuinte o pagamento, e ainda no valor inicialmente pactuado, independentemente do pagamento ter sido ou não efetivado neste período, e em qual valor”;
(4) “não é possível impor ao contribuinte uma apuração estática, tendo em vista que o cálculo perpassa não apenas pelo valor inicialmente previsto para a transação, por exemplo, como também pelas cláusulas e condições contratuais e/ou pelas práticas daquele negócio.
Há, portanto, um montante determinável, que se torna determinado, tão somente no momento do efetivo ingresso, que pode ocorrer em importe inferior aquele originalmente pactuado, por exemplo. É exatamente o contexto fático dos autos”.
A partir dessas premissas, a conselheira Carolina Machado Freire Martins chegou à conclusão de que a “parcela redutora sequer tem natureza jurídica e contábil de receita, de modo que não poderia compor a base de cálculo das contribuições”, dando aqui a entender que se trataria de uma hipótese de não incidência em sentido estrito, mas não se limitou a essa conclusão.
Além dessa conclusão, a referida conselheira ainda defendeu que a não tributação dos descontos concedidos em sede de renegociação poderia ser reconhecida não só pela não incidência em sentido estrito (incompatibilidade com o conceito de receita), mas também por expressa previsão legal, isto é, nos termos das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003 (alínea “a” do inciso V do § 3º do art. 1º).
Segundo a julgadora, “há uma renegociação com a supressão de encargos financeiros, sendo da essência deste segundo instrumento uma ‘bonificação contratual’, ou seja, a redução do valor que deveria ser recebido dos clientes em atraso, sem que se verifique a exigência de qualquer condição após a conclusão da repactuação”.
Desta forma, seja pela via da não incidência em sentido estrito, seja por força das Leis nº 10.637/2002 e º 10.833/2003 (alínea “a” do inciso V do § 3º do art. 1º), só é possível concluir pela impossibilidade de tributação dos descontos concedidos em sede de renegociação, cabendo aos contribuintes buscar o reconhecimento do direito de deduzir os respectivos valores de suas apurações de contribuição ao PIS e de Cofins.
Oportunidade tributária para contribuintes
Por fim, a não incidência de contribuição ao PIS e de Cofins sobre descontos concedidos em sede de renegociação de dívidas com devedores inadimplentes se apresenta como uma oportunidade de considerável relevância para a redução das despesas tributárias, sendo, portanto, recomendável a adoção imediata das medidas cabíveis.
É certo, ainda, que os fundamentos abordados neste artigo incitam o questionamento sobre os casos em que há inadimplemento total e definitivo dos valores submetidos, por força do regime de competência, à incidência de PIS e Cofins. Trata-se de um tema extremamente relevante, que será oportunamente abordado em um artigo subsequente no nosso blog. Por isso, fique ligado no nosso conteúdo.
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Autoria de Heitor Cardoso
Contencioso Tributário
BLB Auditores e Consultores
Revisão de Bruno Carvalho
Consultoria Tributária
BLB Auditores e Consultores
[1] RE 574.706, cuja relatora foi Cármen Lúcia, pelo Tribunal Pleno, sendo julgado em 15/03/2017 e publicado em 02/10/2017. O trecho destacado acima foi extraído do voto da ministra Rosa Weber.
[2] RE 574.706, cuja relatora foi Cármen Lúcia, pelo Tribunal Pleno, sendo julgado em 15/03/2017 e publicado em 02/10/2017. O trecho em questão foi extraído do voto da ministra Rosa Weber.
[3] Trecho retirado de Contratos e atos unilaterais, Coleção Direito civil brasileiro, volume 3, 17. ed., São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
[4] Trecho retirado da obra Curso de direito tributário, 30. Ed, São Paulo: Saraiva Educação, 2019.