O equity crowdfunding é uma nova opção no mercado de investimentos brasileiro que tem tudo para deslanchar, assim como nos EUA, por ser bastante positiva tanto para startups quanto para investidores.
Do lado dos investidores, o contexto econômico brasileiro atual, onde a renda fixa já não remunera mais como outrora, influencia o capital a se mover em maior volume para o mercado de renda variável, com investidores buscando alternativas com maior retorno. Prova disso é o número recorde de CPFs na bolsa de valores de São Paulo (B3), que atingiu a marca 2,24 milhões em março de 2020.
Do lado das startups, levantar recursos para crescer é uma tarefa árdua, mas já foi pior. Se antes os founders viam poucas alternativas senão vender seus bens para iniciar um negócio e financiar o seu crescimento, hoje o cenário é outro.
As rodadas de captação estão aumentando em volume e valor, sendo que 2019 registrou o recorde de investimentos em startups brasileiras. O crescimento foi de 80% com relação ao ano anterior e o valor investido atingiu a expressiva marca de U$ 2,7 bilhões segundo a consultoria Distrito.
Além disso, agentes importantes para o ecossistema, como venture builders, aceleradoras, fundos de investimento, venture capitalists, investidores-anjo, entre outros, se multiplicam pelo país. Mais oportunidades para captação de recursos.
Ok, mas onde e como o equity crowdfunding atua nesse ecossistema de inovação? Continue a leitura para saber tudo sobre essa nova forma de investimento e captação de recursos!
O que é um equity crowdfunding?
De forma pragmática, o equity crowdfunding pode ser definido como o meio pelo qual pessoas investem em negócios não listados na bolsa de valores em troca de cotas dessas empresas. Essas pessoas se tornam “acionistas” e podem ter as suas cotas valorizadas conforme a performance dos negócios nos quais investiram.
A modalidade não tem a liquidez de uma bolsa como a B3, por exemplo, onde milhares de ações são negociadas diariamente e os chamados traders são populares. Pelo contrário, a intenção de um investidor de equity crowdfunding é ver o seu capital ser valorizado no médio ou longo prazo.
O ponto é que os IPOs não são tão comuns para startups brasileiras. Apesar do fato de que abrir capital no Brasil custa próximo da metade em comparação com os EUA, o Brasil tem cerca de 400 empresas listadas na bolsa, enquanto a NASDAQ (uma das bolsas de valores dos EUA), por exemplo, possui mais de 3.800 companhias listadas.
Dentre os motivos, o principal é que é difícil para startups atenderem aos requisitos da CVM tanto para a realização do IPO quanto para a manutenção de estruturas de governança corporativa e compliance de excelência como a das empresas listadas na B3.
Assim, o equity crowdfunding surge como alternativa de financiamento e investimento.
Se antes apenas agentes com considerável capital estavam aptos financeiramente a investirem em startups por conta do valor das cotas nas rodadas e complicadas negociações realizadas diretamente com os fundadores, as plataformas de equity tornaram esse investimento possível.
O nível de complexidade das informações exigidas pela CVM para essa modalidade é mais simples de ser cumprido quando comparado ao de uma empresa de capital aberto. Falaremos mais sobre essa regulação adiante.
Então, ao acessar uma plataforma é comum encontrar rodadas acontecendo com os mais diversos valores e volume de cotas. Por exemplo, a Umbler, startup de cloud-hosting de Florianópolis (SC) levantou R$ 1.000.000 em uma rodada da Captable.
A empresa negociou 3% das suas cotas, sendo avaliada em R$ 35.000.000 antes da rodada. Cada cota estava avaliada em R$ 100 e o lote mínimo era de 100 cotas.
Ou seja, por R$ 1.000 você consegue investir em uma startup, o que antes era inimaginável no Brasil além dos tradicionais investimentos de amigos e familiares. Quem ganha é o ecossistema.
Mas tem futuro no Brasil? Basta olharmos para os EUA. Em 2019, o total investido foi de mais de U$ 137 milhões, crescimento de 59% em comparação com 2018 (U$ 86 milhões).
Como essas plataformas ganham dinheiro?
O canal oferecido para captação não é gratuito. As plataformas ficam com parte do montante captado pela startup, percentual que varia de empresa para empresa. Além disso, algumas ficam também com um percentual sobre o lucro no momento da liquidação das ações por parte do investidor.
Portanto, a regra para o sucesso dessas plataformas é a seleção de negócios com potencial de crescimento exponencial. Afinal, rodadas de captação bem sucedidas e um portfólio de startups com grande potencial de valorização de cotas equivalem a retorno.
Bom para elas e para os investidores, que têm à disposição bons investimentos.
Embora você possa pensar que o serviço é encerrado com a conexão entre quem quer investir com quem quer ser investido, não é bem assim.
As plataformas ainda são responsáveis pelo gerenciamento desses investimentos, relacionamento com investidores, geração de reports de desempenho, entre outras tarefas que contribuem para dar confiabilidade e transparência aos negócios.
Equity crowdfunding x Financiamento coletivo
Apesar de se parecerem no conceito principal (pessoas financiando algo de forma coletiva), são coisas bem diferentes.
Para ilustrar a diferença, vamos fazer uma breve comparação com a principal plataforma de financiamento coletivo, o KickStarter.
O KickStarter foi criado para ser um meio de financiamento coletivo para projetos inovadores. Geralmente, você encontra projetos que ainda estão no papel e precisam de um impulso financeiro para se tornarem reais. São projetos de diversos tipos, sem ou com fins lucrativos.
A diferença começa aí: em plataformas de equity crowdfunding você só encontrará negócios que já estão operando no mercado e com fins lucrativos. Quanto mais potencial de crescimento o negócio tiver, melhor.
Outra diferença é que em plataformas de financiamento coletivo as recompensas estabelecidas pelos investimentos vêm em forma de brindes, descontos em produtos, entre outros.
Nas plataformas de equity não há recompensa estabelecida pelas empresas, a relação é de investimento. Você é um investidor que viu potencial em um negócio e deseja que o valor investido valorize e se torne 10x maior, por exemplo.
Regulação no Brasil
Em termos jurídicos, a modalidade de intermediação de investimentos foi regulamentada no Brasil pela Instrução 588 de 2017 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
A norma foi responsável por trazer uma série de diretrizes a serem seguidas pelas plataformas de equity crowdfunding com o objetivo de dar maior transparência na distribuição dos valores mobiliários disponibilizados e ao alinhamento dos interesses econômicos dos investidores e da empresa que irá receber os recursos.
O principal desafio que a Instrução buscou solucionar foi prover segurança jurídica às plataformas e os investidores, que geralmente estão bastante diluídos nos negócios.
Inspirada no JOBS Act (EUA), a Comissão estabeleceu a dispensa de registro da oferta, o que barateou os custos de captação, uma vez que as empresas não precisam submeter às normas que demandam investimento em auditoria e compliance.
Um outro benefício foi a redução da assimetria informacional entre investidores e empreendedores. Em outras palavras, garantias sobre números e avaliações das empresas, assim como a redução dos riscos de fraudes.
Agora, as empresas são obrigadas a disponibilizar eletronicamente documentos que revelam a saúde da empresa, jurídica e financeiramente.
Vale salientar que dados muito sensíveis relacionados aos negócios não são de divulgação obrigatória.
Como ser investido?
A Instrução centraliza a categorização na renda bruta anual das empresas, não mais em sua estrutura societária.
Se a receita anual do ano anterior for inferior a R$ 10 milhões, o negócio está apto a captar recursos por meio do equity crowdfunding.
Vale salientar que o teto de captação nessa modalidade é de R$ 5 milhões.
Como investir?
O investimento em plataformas por parte de pessoas físicas deve respeitar algumas regras. Por exemplo, uma pessoa pode investir, no máximo, R$ 10 mil por ano-calendário.
No entanto, investidores-líderes (sindicatos de investimentos) e qualificados pela CVM podem exceder esse valor.
Além deles, pessoas cuja renda ou total de investimentos financeiros (dos dois o maior) do ano anterior à oferta tenha sido de mais de R$ 100 mil. Nesse caso, o investidor poderá exceder o teto em 10%.
É importante mencionar que o cumprimento dos requisitos tanto do empreendedor quanto do investidor é de responsabilidade da plataforma, que assume o papel de gatekeeper (responsável pela proteção) de cada oferta e dos negócios participantes.
As plataformas são responsabilizadas financeiramente em caso de descumprimento da legislação, de modo a evitar conflito de interesses e fraudes.
Conclusão
As regulamentação das plataformas de equity crowdfunding é uma conquista para o ecossistema de inovação brasileiro.
Se por um lado os investidores possuem mais opções de investimento em um cenário de juros baixos e renda variável em alta, os empreendedores veem mais um agente de auxílio na difícil jornada de captação de recursos.
O fato de as startups passarem por um processo seletivo para acessarem a base de investidores e o interesse por ativos de qualidade em seu portfólio por parte das plataformas é uma segurança a mais a quem quer investir, embora ainda sejam negócios de alto risco, vale lembrar.
Outro benefício interessante é a prestação de contas por parte das empresas listadas que ambicionam esse investimento, o que dá mais segurança aos negócios. As plataformas nesse segmento já estão inovando ao desenvolverem relatórios cada vez mais completos, informações sempre atualizadas e indicadores para acompanhamento.
Espero que o investimento de pessoas físicas em startups cresça cada vez mais e que tenhamos mais unicórnios brasileiros.
Diego Almeida
CMO da BLB Ventures
Grupo BLB Brasil