CPC 48 (IFRS 9) – PECLD. Parte 2: abordagens geral e ajustada ao crédito

CPC 48 (IFRS 9) – PECLD. Parte 2: abordagens geral e ajustada ao crédito

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Introdução

No artigo anterior introduzimos as 3 abordagens (metodologias) em vigor para as empresas efetuarem as Perdas Estimadas em Créditos de Liquidação Duvidosa (PECLD) (ou impairment) das contas a receber, a saber:

  1. abordagem simplificada;
  2. abordagem geral; e
  3. abordagem ajustada ao crédito.

Discorremos sobre  as perdas estimadas em créditos de liquidação duvidosa, utilizando a abordagem simplificada (que habitualmente é utilizada em empresas que possuem as tradicionais contas a receber mantidas até a liquidação dos devedores), pois, didaticamente a mesma é mais fácil de explicar e, partindo dela, prosseguiremos neste artigo para a compreensão das duas outras metodologias: abordagem geral e abordagem ajustada ao crédito.

Enfatizaremos a abordagem geral, pois a abordagem ajustada ao crédito é uma exceção (um caso pontual) da norma.

Para avançarmos é importante também relembrarmos as classificações dos instrumentos financeiros, vistas também em nosso artigo anterior:

CPC 48 (IFRS 9) – PECLD. Parte 2: abordagens geral e ajustada ao crédito

Vimos que o CPC 48 (IFRS 9) apresenta um novo modelo de reconhecimento e mensuração do teste de recuperabilidade de instrumentos financeiros (modelo das perdas estimadas ao invés do modelo das perdas incorridas), cujo modelo é aplicável para os ativos financeiros classificados ao “custo amortizado”, geralmente as contas ou títulos a receber.

É devido o impairment (a PECLD) dos instrumentos financeiros classificados pelo Valor Justo por Meio do Resultado (VJMR) ou pelo Valor Justo por meio de Outros Resultados Abrangentes (VJORA)?

Via de regra, os itens mensurados ao valor justo por meio do resultado, naturalmente, já tendem a incorporar em suas variações as eventuais deteriorações da qualidade do crédito concedido a terceiros. Em outras palavras, a PECLD dos instrumentos financeiros mensurados pelo valor justo é efetuada naturalmente, pois os ativos são valorizados ao valor de mercado.

Quais das três abordagens acima é a mais adequada para a minha empresa efetuar o cálculo da PECLD?

A resposta depende da composição e das características dos fluxos de caixas contratuais da empresa.

Vamos partir da explicação da abordagem simplificada, que é mais fácil e, na sequência, explanaremos as duas outras abordagens.

O CPC 48 descreve que a abordagem simplificada é utilizada para as contas a receber que estão dentro do alcance do CPC 47 (IFRS 15: Receitas) e que estas contas a receber não contêm um componente de financiamento significativo.

Para as contas a receber que estejam nos alcances do CPC 47 (Receitas) ou CPC 06 (IFRS 16: Arrendamento) e que possuem um componente de financiamento significativo, a empresa deve utilizar as outras duas abordagens do impairment, ou seja, abordagem geral ou abordagem ajustada ao crédito. 2ª regra!

Porém, por opção a entidade pode utilizar a abordagem simplificada.

Resumindo:

  • A abordagem simplificada é obrigatória para as entidades que operam com contas a receber que não contêm um componente de financiamento significativo.
  • A abordagem geral é para empresas que operam com um componente de financiamento significativo; e
  • Por exceção (em caso pontual), a abordagem ajustada ao crédito é utilizada para ativos já contabilizados inicialmente com problemas de não recuperação, por exemplo, ativos adquiridos com um alto desconto em virtude do risco de crédito.

Isso posto, na prática, as empresas devem levar em consideração o custo-benefício de se extrair uma informação. Em outras palavras, não é de se esperar que uma empresa que opere com um prazo de recebimento baixo e sem um componente de financiamento significativo em suas contas a receber utilize uma abordagem diferente da abordagem simplificada. Por outro lado, é imprudente uma instituição financeira operar com a abordagem simplificada de perdas estimadas para os seus títulos a receber.

Esquematicamente, temos as seguintes abordagens (metodologias) para o cálculo da PECLD:

CPC 48 (IFRS 9) – PECLD. Parte 2: abordagens geral e ajustada ao crédito

Abordagem simplificada para o cálculo da PECLD

Essa abordagem foi analisada em nosso artigo anterior. Para maiores detalhes, pedimos que consultem o texto: CPC 48 (IFRS 9) – Perdas Estimadas em Créditos de Liquidação Duvidosa (PECLD): abordagem simplificada.

Abordagem geral para o cálculo da PECLD

O foco desta abordagem é o “risco de crédito”, ou seja, se o mesmo aumentou desde o reconhecimento inicial. Opera-se nesta abordagem com três estágios para se calcular a PECLD.

  • 1º estágio: inicialmente a PECLD é calculada para o período de 12 meses;
  • 2º estágio: posteriormente, ou seja, na data do balanço, se o risco de crédito do ativo (o risco de crédito do recebimento das contas a receber) aumentou significativamente, então a entidade deve calcular a PECLD para toda a vida do ativo;
  • 3º estágio: finalmente, caso existam mais elementos que aumentem a probabilidade de inadimplência, o ativo financeiro tem majoração da probabilidade de perda e, sua receita financeira passa a ser reconhecida no resultado líquido da PECLD.

Esquematicamente temos 3 estágios de cálculo da PECLD na abordagem geral:

CPC 48 (IFRS 9) – PECLD. Parte 2: abordagens geral e ajustada ao crédito

Basicamente, o modelo dos três estágios acima apresentado é simples. Porém, no dia a dia, existe a complexidade da classificação do ativo do primeiro para o segundo ou terceiro estágio. Sem dúvida isso não é uma tarefa fácil. Adicionalmente, o CPC 48 (IFRS 9) indica que as empresas devem considerar informações razoáveis e suportáveis disponíveis sem custos ou esforços indevidos, incluindo dados sobre informações passadas e futuras para a realização dessas classificações.

Ou seja, qual o “gatilho” da empresa para a classificação de um estágio para o outro?

Independentemente da forma como a entidade avalia os aumentos relevantes no risco de crédito, o CPC 48 (IFRS 9) descreve que existe uma presunção refutável de que o risco de crédito de ativo financeiro aumentou significativamente desde o reconhecimento inicial quando os pagamentos contratuais estiverem vencidos há mais de 30 dias.

Adicionalmente, chamamos a atenção ao que descreve a norma: “a entidade não pode se basear exclusivamente em informações sobre pagamentos vencidos para determinar se o risco de crédito aumentou significativamente desde o reconhecimento inicial.”

Fechando o assunto da transitividade dos três estágios (mudança do estágio 1 para o 2 ou para o 3), do mesmo modo que um ativo pode avançar de um estágio para o outro (em função de um cenário econômico deteriorado, como exemplo) o mesmo ativo pode voltar para os estágios anteriores (recuperação econômica).

Exemplo prático da cálculo da PECLD, utilizando  a abordagem geral

  • Cenário 1Presunção de que o reconhecimento da PECLD para 12 meses é apropriado.

A entidade ABC concede um empréstimo amortizável em 10 anos de $ 1 milhão e faz as estimativas a seguir.

As contas a receber, ou seja, os empréstimos a receber, têm uma Probabilidade de Inadimplência (PI) em 12 meses de 0,5%; e na data do relatório (que é antes que o pagamento do empréstimo seja devido), não ocorreu alteração na Probabilidade de Inadimplência de 12 meses, e a entidade ABC determina que não houve aumento significativo no risco de crédito desde o reconhecimento inicial.

A entidade ABC determina que 25% do valor contábil bruto deve ser perdido se o empréstimo não for pago. A entidade ABC mensura a provisão para perdas no valor equivalente às perdas de crédito esperadas para 12 meses utilizando a PI de 12 meses de 0,5%.

Logo, a probabilidade de 99,5% de que não deve ocorrer inadimplência está implícita nesse cálculo. Na data do relatório, o ajuste para as perdas de crédito esperadas para 12 meses é de $ 1.250 (0,5% × 25% × $ 1.000.000).

  • Cenário 2Presunção de que o reconhecimento da PECLD para a todo o ciclo de vida do ativo é apropriado.

A entidade XYZ possui contas a receber em uma região específica. Essa região inclui a comunidade de uma indústria frigorífica que é, em grande parte, dependente da exportação de carne bovina.

A entidade XYZ fica sabendo de uma diminuição significativa nas exportações de carne, prevendo a demissão de vários trabalhadores do segmento frigorífico. A entidade XYZ estima um aumento na taxa de desemprego nessa comunidade e determina que o risco de crédito e de inadimplência dos tomadores de empréstimo que dependem dos frigoríficos na região aumentou significativamente, mesmo que aqueles tomadores não estejam inadimplentes na data do balanço.

Dessa maneira, a entidade XYZ segmenta sua carteira de contas a receber com base em setores econômicos, ou seja, uma característica compartilhada de risco de crédito para identificar os tomadores que dependem da indústria frigorífica. Para essas contas a receber, a entidade XYZ reconhece uma provisão equivalente às perdas de crédito esperadas para a vida inteira.

Conclusão

CPC 48 (IFRS 9) – PECLD. Parte 2: abordagens geral e ajustada ao crédito

Verificamos as três abordagens (metodologias) para o cálculo da PECLD requeridas pela IFRS 9 (CPC 48).

Tratamos detalhadamente, em nosso artigo anterior, da abordagem simplificada (que normalmente é mais utilizada para as empresas que possuem as contas a receber tradicionais) e  verificamos  neste artigo as abordagens geral e a ajustada ao crédito, com ênfase na abordagem geral, pois a abordagem ajustada ao crédito é uma exceção (um caso pontual) na norma.

Sem dúvida, a abordagem simplificada é mais fácil de se operacionalizar. Porém, as entidades que lidam com as contas a receber que possuem um componente de financiamento significativo (como as instituições financeiras) devem utilizar as outras duas metodologias: abordagem geral ou abordagem ajustada ao crédito.

Neste contexto, a estrutura do departamento de “risco de crédito” deve ser robusta e compatível com as atividades da entidade, pois em uma análise da probabilidade de inadimplência, as entidades devem verificar, entre outros requisitos: a situação econômico-financeira do tomador do crédito, seu grau de endividamento, seu histórico de pagamento, o segmento e a atividade econômica em que o mesmo opere, além das considerações acercas da finalidade e da natureza da transação e as garantias e valores envolvidos.

Salientamos que o cálculo da PECLD não é mecanicista ou automático, pois o mesmo dependente de diversas variáveis e deve ser efetuado não somente por quem entende bem a entidade e o seu ramo de negócio, mas também por profissionais compreendam a conjuntura econômica do momento em que a estimativa está sendo efetuada etc.

Não podemos deixar de lembrar que o entendimento das normas internacionais contábeis (IFRS) é um conhecimento basilar para o profissional da contabilidade, a fim de que as demonstrações financeiras sejam mensuradas, apresentadas e divulgadas adequadamente para os usuários das mesmas, ou seja, para os administradores, investidores, credores, acionistas, governo etc.

A equipe do  Grupo BLB Brasil é especialista nas aplicações das IFRS, com experiências práticas em diversos clientes, oferecendo todo suporte necessário para adaptação as normas IFRS e inclusive nas áreas de auditoria independente; consultorias tributáriatrabalhista.

Remerson Galindo de Souza
Sócio-gerente de Auditoria Independente do Grupo BLB Brasil

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