CPC 23/IAS 8: procedimentos relacionados à política contábil, estimativa contábil e retificação de erro

CPC 23/IAS 8: procedimentos relacionados à política contábil, estimativa contábil e retificação de erro

10 minutos de leitura

No artigo de hoje serão tratados temas avançados do CPC 23, correlacionado à norma internacional contábil IAS 8, que trata de Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro.

Recomendo ao leitor a prévia leitura do artigo anterior sobre o CPC 23, já que diversos conceitos empregados neste artigo foram explicados naquela publicação.

O intuito do artigo é tratar dos três principais elementos da norma contábil: política contábil, estimativa contábil e erros de períodos anteriores.

Obrigatoriedade da uniformidade nas políticas contábeis

O CPC 23 estabelece obrigatoriedade por parte da entidade de adotar uma política contábil uniforme nas transações semelhantes, outros eventos e condições, a menos que outra norma contábil especificamente exija ou permita a classificação de itens para os quais possam ser aplicadas diferentes políticas – nesse caso, serão aplicadas tais políticas para cada categoria.

De forma mais simples, a norma estabelece que para cada categoria de transação, evento e condição deverá ser adotada a mesma política contábil, visando à uniformidade ao tratamento contábil aplicável.

Alterações nas políticas contábeis adotadas pela entidade

A política contábil adotada pela entidade deverá ser alterada nas situações em que a mudança:

  • seja exigida por Pronunciamento, Interpretação ou Orientação; ou
  • resulte em informação confiável e mais relevante nas demonstrações contábeis sobre os efeitos das transações, outros eventos ou condições acerca da posição patrimonial e financeira, do desempenho ou dos fluxos de caixa da entidade.

Ora, conforme já explicado no artigo anterior, os usuários das demonstrações contábeis precisam ter a possibilidade de compararem as demonstrações contábeis da entidade ao longo do tempo, posto que assim podem identificar tendências na posição patrimonial e financeira, no seu desempenho e nos seus fluxos de caixa.

Porém, existem situações que, embora se assemelhem, não serão consideradas alterações de política contábil:

  • Adoção de política contábil para transações, outros eventos ou condições que difiram em essência daqueles que ocorriam anteriormente;
  • Adoção de nova política contábil para transações, outros eventos ou condições que não ocorriam anteriormente ou eram imateriais.

Como já visto no artigo anterior, no caso de mudança da política contábil a aplicação será de forma publicada retrospectiva, ou seja, a entidade deverá ajustar o saldo de abertura de cada componente do patrimônio líquido afetado para o período anterior mais antigo apresentado e os demais montantes comparativos divulgados para cada período anterior apresentado, como se a nova política contábil tivesse sempre sido aplicada.

Nessa toada, reitero, a entidade deverá apresentar valores comparativos do ano anterior como se a nova política contábil tivesse sempre sido aplicada.

Estimativas contábeis e suas aplicações

Por sua própria natureza, a estimativa não apresenta valores com alta precisão. Pelo contrário, em razão das incertezas inerentes às atividades empresariais, muitos itens nas demonstrações contábeis não podem ser mensurados com precisão.

A estimativa envolve julgamentos baseados na última informação que estava disponível e confiável, daí a razão da incerteza futura. Para facilitar a compreensão do tema, são exemplos de estimativas contábeis:

  • créditos de liquidação duvidosa;
  • obsolescência de estoque;
  • valor justo de ativos financeiros ou passivos financeiros;
  • vida útil de ativos depreciáveis ou o padrão esperado de consumo dos futuros benefícios econômicos incorporados nesses ativos; e
  • obrigações decorrentes de garantias.

A norma contábil estabelece que o uso de estimativas razoáveis é parte essencial da elaboração de demonstrações contábeis e não reduz sua confiabilidade. Entretanto, a estimativa pode necessitar de revisão, caso ocorram alterações das circunstâncias em que a estimativa se baseou – ou em consequência de novas informações ou de maior experiência.

É preciso ressaltar que, diferentemente dos casos de política contábil, o efeito de mudança na estimativa contábil deverá ser reconhecido prospectivamente, incluindo-o nos resultados do:

  • período da mudança, se a mudança afetar apenas esse período; ou
  • período da mudança e futuros períodos, se a mudança afetar todos eles.

Não obstante, a norma contábil confirma que se a mudança na estimativa contábil resultar em mudanças em ativos e passivos ou relacionar-se a componente do patrimônio líquido, tal mudança deve ser reconhecida pelo ajuste no correspondente item do ativo, do passivo ou do patrimônio líquido no período da mudança. Em outras palavras, será realizado o lançamento de ajuste na escrita contábil.

O CPC 23 estabelece ainda que, quando for difícil distinguir uma mudança na política contábil de uma mudança na estimativa contábil, a mudança é tratada como mudança na estimativa contábil.

Compreendido de forma avançada os conceitos de estimativa contábil e política contábil, torna-se necessário a compreensão dos procedimentos de retificação de erros.

Procedimentos para retificação de erros

Os erros contábeis podem ocorrer principalmente em quatro campos das demonstrações contábeis:

  • no registro;
  • na mensuração;
  • na apresentação; ou
  • na divulgação.

É necessário compreender que as demonstrações contábeis não estarão em conformidade se contiverem erros materiais ou erros imateriais cometidos intencionalmente para alcançar determinada apresentação da posição patrimonial e financeira.

Portanto, os potenciais erros do período corrente, descobertos no próprio período, devem ser corrigidos antes das demonstrações contábeis serem autorizadas para publicação. Contudo, os erros materiais que foram descobertos apenas num período subsequente, deverão ser divulgados nas informações comparativas das demonstrações no período subsequente.

Dessa forma, a entidade deverá corrigir, no primeiro conjunto de demonstrações contábeis cuja autorização para publicação ocorra após a descoberta, os erros materiais de períodos anteriores retrospectivamente:

  • por reapresentação dos valores comparativos para o período anterior apresentado em que tenha ocorrido o erro; ou
  • se o erro ocorreu antes do período anterior mais antigo apresentado, da reapresentação dos saldos de abertura dos ativos, dos passivos e do patrimônio líquido para o período anterior mais antigo apresentado.

A reapresentação retrospectiva encontra certas limitações estabelecidas na norma contábil, conforme demonstrado no tópico seguinte.

Limitação à reapresentação retrospectiva

Conforme definido no tópico anterior, em regra, o erro implicará na necessidade de uma reapresentação retrospectiva; ou seja, a norma contábil estabelece que um erro de período anterior deva ser corrigido por reapresentação retrospectiva, salvo quando impraticável a aplicação retrospectiva.

Nessa linha, quando for impraticável determinar os efeitos de erro em um período específico na informação comparativa para um ou mais períodos anteriores apresentados, a entidade deverá retificar os saldos de abertura de ativos, passivos e patrimônio líquido para o período mais antigo para o qual seja praticável a reapresentação retrospectiva (que pode ser o período corrente).

De resto, se for impraticável determinar o efeito cumulativo, no início do período corrente, do erro em todos os períodos anteriores, a entidade deverá retificar a informação comparativa para corrigir o erro prospectivamente a partir da data mais antiga praticável.

A retificação de erro de período anterior, portanto, deverá ser excluída dos resultados do período em que o erro é descoberto. Além disso, qualquer informação apresentada sobre períodos anteriores, incluindo qualquer resumo histórico de dados financeiros, deve ser retificada para períodos tão antigos quanto for praticável.

É possível concluir que a norma busca corrigir o erro da forma mais retrospectiva quanto possível, dando preferência ao alcance do período em que o erro ocorreu. Entretanto, caso não seja possível retroagir a tal período, deverá ser aplicada à retroatividade ao período mais antigo possível.

A fim de evitar confusão nos conceitos, é importante ressaltar que as estimativas contábeis, por sua natureza, são aproximações que podem necessitar de revisão à medida que se conhece informação adicional, essa característica não se confunde com o erro. Por exemplo, o ganho ou a perda reconhecida no momento do desfecho de contingência, que, anteriormente, não podia ser estimada com precisão, não constitui retificação de erro.

Haveria erro se houvesse falhas que comprometessem o processo de obtenção da estimativa, mas a simples divergência entre o estimado e o real não constitui erro.

Um detalhe importante é que na reapresentação retrospectiva a divulgação ocorrerá no período corrente em que o erro é descoberto. Para melhor compreensão do tema detalharemos no próximo tópico as principais regras de divulgação.

Divulgação de erros de períodos anteriores

A entidade deverá corrigir os erros materiais de períodos anteriores retrospectivamente no primeiro conjunto de demonstrações contábeis cuja autorização para publicação ocorra após a descoberta de tais erros. A divulgação será única, ou seja, as demonstrações contábeis de períodos subsequentes à retificação do erro não precisam repetir essas divulgações.

Com intuito de regularizar o tema, a própria norma contábil estabelece um conjunto de requisitos que precisam constar nessa divulgação – dos quais citamos:

  • a natureza do erro de período anterior;
  • o montante da retificação para cada período anterior apresentado, na medida em que seja praticável:
    • para cada item afetado da demonstração contábil; e
    • se o Pronunciamento Técnico CPC 41 – Resultado por Ação se aplicar à entidade, para resultados por ação básicos e diluídos;
  • o montante da retificação no início do período anterior mais antigo apresentado;
  • as circunstâncias que levaram à existência dessa condição e uma descrição de como e desde quando o erro foi corrigido, se a reapresentação retrospectiva for impraticável para um período anterior em particular.

Conclusão

Neste e no primeiro artigo sobre o assunto foram apresentados desde os aspectos básicos do CPC 23/IAS 8 até os processos e procedimentos vinculados à sua aplicação, inclusive sua divulgação.

Embora seja um tema não muito complexo, a aplicação da norma exige uma equipe profissional capacitada para vencer seis importantes obstáculos:

  • Adoção de um sistema de estimativa que seja confiável e prático;
  • Controle de uniformidade da política contábil adotada para ocorrências de mesma categoria;
  • Acompanhamento das divulgações necessárias caso haja mudança nas políticas contábeis;
  • Acompanhamento e divulgação dos erros de períodos anteriores;
  • Adoção de um sistema de registro histórico das práticas e políticas adotadas, a fim de evitar que eventual aplicação retrospectiva seja impraticável;
  • Estudo dos efeitos da alteração da política contábil, nos resultados passados e futuros da entidade.

Conhecendo tais obstáculos, a BLB Brasil tem dado apoio satisfatório a diversos clientes por meio de especialistas nas áreas de auditoria e consultoria. Em caso de dúvidas ou esclarecimentos, entre em contato conosco.

Gabriel Tavares
Graduado em Direito pelas Faculdades COC, pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).

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