No último artigo publicado neste site sobre o CPC 20 – Custos de empréstimos, restaram evidenciados seus aspectos básicos, inclusive as definições de ativo qualificável, custos de empréstimo, dentre outros elementos de suma importância para a compreensão do tema.
No artigo de hoje serão disponibilizados aspectos mais avançados no reconhecimento dos custos de empréstimos, incluindo: capitalização, impacto tributário, suspensão e cancelamento.
Capitalização dos custos de empréstimos no CPC 20
A norma estabelece que a entidade deve iniciar a capitalização dos custos de empréstimos como parte do custo de um ativo qualificável na data de início. Define ainda que a data de início para a capitalização é a primeira data em que a entidade satisfaz todas as seguintes condições:
1º – incorre em custos de empréstimos;
2º – incorre em gastos com o ativo;
3º – inicia as atividades que são necessárias ao preparo do ativo para seu uso ou venda pretendidos.
Portanto, temos três importantes requisitos que precisam ser considerados cumulativamente (todos precisam ser cumpridos) para que a entidade possa iniciar a capitalização e, assim, reconhecer os custos dos empréstimos nos ativos qualificáveis.
Dos três requisitos supramencionados, o primeiro já foi explicado em outro artigo, entretanto, o segundo e o terceiro merecem maiores detalhes:
- Gastos com o ativo qualificável incluem somente aqueles gastos que resultam em pagamento em caixa, transferências de outros ativos ou assunção de passivos onerosos.
- As atividades necessárias ao preparo do ativo para seu uso ou venda pretendidos abrangem mais do que a construção física do ativo. Elas incluem trabalho técnico e administrativo anterior ao início da construção física, tais como atividades associadas à obtenção de permissões para o início da construção física (por exemplo, licenças). Entretanto, tais atividades excluem a de manter um ativo quando nenhuma produção ou nenhum desenvolvimento que altere as condições do ativo estiver sendo efetuado. Por exemplo, custos de empréstimos incorridos enquanto um terreno está em preparação devem ser capitalizados durante o período em que tais atividades relacionadas ao desenvolvimento estiverem sendo executadas. Entretanto, custos de empréstimos incorridos enquanto o terreno adquirido para fins de construção for mantido sem nenhuma atividade de preparação associada não se qualificam para capitalização.
Tendo em vista que a etapa de reconhecimento é um dos maiores obstáculos na correta aplicação do CPC 20 (R1), é interessante a análise de um caso prático:
Uma indústria de Ribeirão Preto em fase de expansão, por razões estratégicas, decidiu pela construção de uma nova unidade produtiva, ao invés de ampliar o atual parque industrial, adquirindo três terrenos para construir a nova unidade fabril com financiamentos de longo prazo.
O desenvolvimento do projeto e a construção da unidade encontram-se na seguinte situação:
- Terreno A: em fase de licenciamento ambiental, embora nenhuma construção física tenha sido iniciada;
- Terreno B: em fase de terraplanagem para o nivelamento do terreno, indispensável à construção das unidades produtivas;
- Terreno C: não precisa de licenciamento ambiental e, como é destinado à construção das unidades para estocagem dos produtos, 3ª fase do projeto, por enquanto nada está sendo feito nele, mas serve como estacionamento de visitantes, quando necessário.
Com intuito de capitalizar os gastos no ativo, a fim de obter melhores resultados financeiros, a entidade solicita esclarecimentos junto à equipe da BLB Brasil sobre quais terrenos estariam aptos a permitir a capitalização do custo dos empréstimos.
Os consultores da BLB Brasil orientam que a entidade poderá capitalizar no ativo os custos dos empréstimos relacionados ao terreno A, posto que a fase de licenciamento é considerada como atividade de preparação do ativo. Também poderá capitalizar o terreno B, em razão da preparação do ativo por meio da terraplanagem. Porém, não poderá capitalizar o custo dos empréstimos relacionados ao Terreno C, tendo em vista que, embora integre uma parte importante do projeto, não cumpre o requisito de preparação do ativo.
Quando suspender a capitalização?
Em alguns casos, a entidade deverá suspender a capitalização.
O CPC 20 estabelece que a entidade deve suspender a capitalização dos custos de empréstimos durante períodos extensos em que suspender as atividades de desenvolvimento de um ativo qualificável.
A entidade pode incorrer em custos de empréstimos durante um período extenso em que as atividades necessárias ao preparo do ativo para seu uso ou venda pretendidos estão suspensas. Tais custos são custos de se manter os ativos parcialmente concluídos e não se qualificam para capitalização, logo, nesses casos será preciso o reconhecimento do custo do empréstimo como despesa financeira (não mais o incorporando-o ao ativo).
Entretanto, a entidade normalmente não suspende a capitalização dos custos de empréstimos durante um período em que substancial trabalho técnico e administrativo está sendo executado. A entidade também não deve suspender a capitalização de custos de empréstimos quando um atraso temporário é parte necessária do processo de concluir o ativo para seu uso ou venda pretendidos.
Por exemplo, a capitalização deve continuar ao longo do período em que o nível elevado das águas atrasar a construção de uma ponte, se tal nível elevado das águas for comum durante o período de construção na região geográfica envolvida.
Quando é preciso cessar a capitalização?
O CPC 20 orienta que a entidade deva cessar a capitalização dos custos de empréstimos quando substancialmente todas as atividades necessárias ao preparo do ativo qualificável para seu uso ou venda pretendidos estiverem concluídas.
A norma contábil expõe que um ativo normalmente está pronto para seu uso ou venda pretendidos quando a construção física do ativo estiver finalizada, mesmo que trabalho administrativo de rotina possa ainda continuar.
Além disso, é preciso compreender que se modificações menores, tal como a decoração da propriedade sob especificações do comprador ou do usuário, resumirem-se a tudo o que está faltando, isso é indicador de que substancialmente todas as atividades estão completas.
É preciso notar que muitas entidades têm continuado a capitalização dos custos nessas etapas de decoração, por exemplo, algumas construtoras, o que revela uma adoção incorreta segundo a norma contábil. Portanto, a partir do momento que o ativo estiver pronto para uso, ainda que não esteja completamente finalizado (decoração, detalhes etc.), a entidade deverá cessar a capitalização.
Por fim, quando a entidade completa a construção de um ativo qualificável em partes e cada parte pode ser utilizada enquanto a construção de outras partes continua, a entidade deve cessar a capitalização dos custos de empréstimos quando completar substancialmente todas as atividades necessárias ao preparo dessa parte para seu uso ou venda pretendidos.
Por exemplo, um centro de negócios compreendendo diversos edifícios, cada um deles podendo ser utilizado individualmente, é um exemplo de ativo qualificável no qual cada parte está em condições de ser utilizada enquanto a construção das outras partes continua. Um exemplo de ativo qualificável que precisa estar completo antes de qualquer parte poder ser utilizada é uma planta industrial que envolve diversos processos que são executados sequencialmente nas diversas partes da planta no mesmo local, tal como uma siderúrgica.
Capitalização dos custos dos empréstimos e o impacto tributário
A Lei 12.973/14 alterou o artigo 17 do Decreto-Lei 1.598/77, ao permitir expressamente que o custo dos empréstimos atribuído aos ativos qualificáveis seja dedutível do imposto de renda:
Art. 17. (…)os juros pagos ou incorridos pelo contribuinte são dedutíveis como custo ou despesa operacional, observadas as seguintes normas: (…)
b) os juros e outros encargos, associados a empréstimos contraídos, especificamente ou não, para financiar a aquisição, construção ou produção de bens classificados como estoques de longa maturação, propriedade para investimentos, ativo imobilizado ou ativo intangível, podem ser registrados como custo do ativo, desde que incorridos até o momento em que os referidos bens estejam prontos para seu uso ou venda.
Conforme o artigo supramencionado, serão dedutíveis do imposto de renda inclusive os juros e encargos sem destinação específica, mas aplicados na construção, aquisição ou produção do ativo qualificável. Nesse caso, deverá ser adotada a regra de reconhecer a capitalização por meio da taxa da média ponderada.
Além disso, a referida norma permite, à opção do contribuinte, que tais custos sejam excluídos na apuração do imposto de renda quando incorridos, podendo ser adicionados quando o ativo for realizado – mediante depreciação, amortização, exaustão, alienação ou baixa:
3o Alternativamente(…), os juros e outros encargos poderão ser excluídos na apuração do lucro real quando incorridos, devendo ser adicionados quando o respectivo ativo for realizado, inclusive mediante depreciação, amortização, exaustão, alienação ou baixa.”
Tal disposição foi incorporada ao texto legal para atender o pleito de muitas empresas, já que tal medida pode ser muito benéfica em determinadas situações – nesse sentido, orienta-se uma análise mais apurada, por meio de uma equipe técnica competente, para que se possa simular seus possíveis efeitos tributários, já que a adoção em alguns casos pode ser prejudicial à entidade.
Capitalização dos custos dos empréstimos e sua aplicação empresarial
A capitalização dos custos dos empréstimos está em consonância com as normas contábeis internacionais (IAS 23), sendo no Brasil regulado pelo CPC 20.
A capitalização pode ser uma importante ferramenta para que entidades possam obter um melhor resultado financeiro, ademais, é uma adoção de suma importância para entidades que busquem a adoção de uma contabilidade que esteja em consonância com as determinações dos pronunciamentos contábeis.
Embora o conceito não seja complexo, a correta aplicação do CPC 20 pode apresentar alguns embaraços, inclusive na área tributária – principalmente em relação ao imposto de renda com base no lucro real.
Outros fatores importantes na aplicação do CPC 20 são quanto à análise de contratos de financiamento, planejamento tributário (reconhecer os custos quando incorridos ou quando realizados), cálculo da taxa de capitalização, dentre outros.
Por todos esses motivos, é possível concluir que a correta aplicação do CPC 20 envolve não apenas conhecimento contábil, mas também experiência na área tributária, empresarial e de matemática financeira.
A BLB Brasil possui uma equipe multidisciplinar, apta a atuar em conjunto na área contábil, tributária e empresarial, com vistas a promover o melhor aproveitamento possível na aplicação do CPC 20.
Gabriel Tavares
Graduado em Direito pelas Faculdades COC, pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).