Neste artigo vamos tratar de um mecanismo financeiro de proteção aos riscos vinculados a ativos e passivos das empresas, mais especificamente o hedge. Nossa intenção aqui não é aprofundarmos nos mecanismos de hedge em si, mas sim entender como se dá a tributação de hedge pelo IRPJ, CSLL, PIS e Cofins considerando a opção pelo Lucro Real; dúvida muito frequente por parte do contribuinte e que buscaremos simplificar a seguir.
De forma bastante resumida, temos que a operação de hedge tem como objetivo a proteção aos bens, direitos, obrigações inerentes às oscilações de preço ou de taxas ao longo do tempo. Para maiores detalhes em relação aos mecanismos de hedge recomendamos a leitura deste artigo.
Tributação de hedge pelo IRPJ e CSLL
Posto isso, passamos a discorrer sobre a forma como a legislação tributária regulamentou a matéria em relação à incidência do IRPJ e da CSLL, tendo em vista que o mais importante é entender a dedutibilidade das perdas decorrente dessa operação, uma vez que os ganhos serão sempre tributados.
Em primeiro lugar vamos analisar o critério temporal, qual seja, o momento em que o resultado (ganhos e perdas) deve impactar a apuração do IRPJ e da CSLL no Lucro Real. Neste caso, temos que os resultados positivos ou negativos serão reconhecidos – para efeito tributário – apenas quando de sua realização, conforme determina o artigo 32 da Lei 11.051/04.
Ou seja, os resultados decorrentes das operações de hedge, as quais se incluem no rol de operações relacionadas no eludido artigo 32, deverão ser oferecidos à tributação apenas quando da liquidação do contrato.
Contudo, conforme já sabemos, do ponto de vista contábil os contratos de hedge estão sujeitos ao ajuste a valor justo, portanto, sua variação é reconhecida contabilmente durante toda a vigência do contrato.
Assim, tendo em vista que os resultados devem ser tributados apenas quando da realização do contrato, esses serão adicionados (no caso de perda) ou excluídos (no caso de ganho) na apuração do Lucro Real e apenas impactarão o Lucro Real quando da liquidação do contrato.
Superado quanto ao critério temporal de oferecimento à tributação das variações decorrentes das operações de hedge, importante entender agora os critérios a serem observados para a dedutibilidade das perdas com essa operação. Nesse caso, precisamos buscar o art. 107 da IN 1.700/17 que regulamenta a matéria. Vejamos:
Art. 107. Consideram-se operações realizadas para fins de hedge as operações com derivativos destinadas, exclusivamente, à proteção contra riscos inerentes às oscilações de preço ou de taxas, quando o objeto do contrato negociado:
I – estiver relacionado com as atividades operacionais da pessoa jurídica; e
II – destinar-se à proteção de direitos ou obrigações da pessoa jurídica.
§1º O disposto no caput aplica-se também às operações de hedge realizadas nos mercados financeiro ou de liquidação futura de taxas de juros, de preços de título ou valor mobiliário, de mercadoria, de taxa de câmbio e de índices, desde que objetivem a proteção de negócios relacionados com a atividade operacional da empresa e se destinem à proteção de direitos ou obrigações da pessoa jurídica.
Percebam que a legislação procurou, em primeiro lugar, conceituar de forma exaustiva a operação de hedge, conceito esse que deve ser observado na íntegra quando da análise quanto à dedutibilidade das perdas.
Reparem que fica claro que a operação de hedge deve, (i) obrigatoriamente destinar-se à proteção contra riscos inerentes às oscilações de preço ou de taxa e ainda que essa proteção (ii) esteja relacionada às atividades operacionais da pessoa jurídica e (ii) destinar à proteção de direitos e obrigações da pessoa jurídica (ex.: proteção de empréstimos em dólar, valores a receber decorrentes de exportação, valores a pagar decorrentes de importação etc.).
Pensando do ponto de vista lógico da norma, o que se busca aqui é não permitir a dedutibilidade de perdas decorrente de operações especulativas no mercado financeiro, mas tão somente aquelas operações contratadas com o objetivo de proteger os direitos e obrigações decorrentes das atividades operacionais da empresa.
Na sequência, tendo em vista que tais condições são extremamente subjetivas, procurou o regulamento estabelecer alguns critérios para nortear o cumprimento das condições estabelecidas no artigo anterior. Para tanto, precisamos analisar o art. 108 da mesma IN 1.700/17, conforme segue:
Art. 108. Sem prejuízo do disposto no art. 107, as operações com instrumentos financeiros derivativos destinadas a hedge devem atender, cumulativamente, às seguintes condições:
I – ter comprovada a necessidade do hedge por meio de controles que mostrem os valores de exposição ao risco relativo aos bens, direitos, obrigações e outros itens objeto de hedge, destacados o processo de gerenciamento de risco e a metodologia utilizada na apuração desses valores; e
II – ter demonstrada a adequação do hedge por meio de controles que comprovem a existência de correlação, na data da contratação da operação, entre as variações de preço do instrumento de hedge e os retornos esperados pelos bens, direitos, obrigações e outros itens objeto de hedge.
Veja que a legislação determina várias exigências e controles que visam demonstrar a conhecida efetividade do hedge, tendo que essa é uma condição para a dedutibilidade de eventuais perdas.
Para tanto, a IN determina a necessidade de comprovação cumulativa da (i) necessidade de hedge, bastando para tal a existência de direitos e obrigações decorrente da atividade operacional da companhia que esteja sujeita a riscos financeiros decorrentes da variação de preço ou de taxa, (ii) comprovação da política da companhia utilizada no gerenciamento de risco, demonstrando de forma objetiva a metodologia utilizada, (iii) demonstração da correlação temporal entre os resultados obtidos na operação de hedge (ganho ou perda) e as variações ocorridas no valor dos bens, direitos e obrigações – objetos de hedge – devendo essas serem balanceadas.
Superada a questão das condições a serem observadas em relação à comprovação do hedge, passamos a discorrer, por fim, sobre a dedutibilidade de eventuais perdas com hedge.
Neste ponto temos que, caso a companhia atenda a essas condições, não haverá nenhum impedimento quanto à dedutibilidade de perda decorrente dessas operações, bastando respeitar o critério temporal que, conforme já dito anteriormente, deve ocorrer apenas quando da liquidação do contrato.
Por outro lado, caso a empresa não tenha condições de comprovar tais condições, a dedutibilidade das perdas com o hedge (especulativo) ficará limitada aos ganhos auferidos no mesmo período com renda variável, inclusive swap. Em outras palavras, caso a companhia possua investimento em outras operações com renda variável, inclusive outros hedge ou swap, a perda decorrente do hedge (especulativo) dedutível no Lucro Real será limitada aos ganhos auferidos nessas outras operações e o excedente não poderá ser aproveitado como despesa, devendo, portanto, ser adicionado na apuração do Lucro Real.
Tributação de hedge pelo PIS/Cofins
Em relação ao PIS/Cofins a lógica é a mesma, tanto em relação ao critério temporal quanto à diferenciação de tratamento de hedge efetivo e hedge especulativo, conceitos já explorados acima.
Assim, tratando de receita financeira decorrente de ganhos com operação de hedge efetivo, essa é beneficiada pela tributação à alíquota zero conforme determina o art. §4º do artigo 1º do Decreto 8.426/15.
Por outro lado, caso a empresa não consiga comprovar a efetividade do hedge, as receitas financeiras decorrentes dessa operação serão tributadas à alíquota de 0,65% para o PIS e de 4% para a Cofins.
Por fim, em relação ao critério temporal, conforme dito anteriormente, essas receitas devem compor a base de cálculo do PIS/Cofins apenas quando de sua liquidação.
Conforme puderam perceber, existem vários critérios legais que devem ser observados em relação à tributação das operações com hedge, e espero ter elucidado esses detalhes neste artigo.
Esses são apenas exemplos de pontos que são analisados, com alto nível de detalhe, pela equipe de especialistas da BLB Brasil em nosso serviço de Revisão Tributária Preventiva. Será que sua empresa está observando todas essas condições?
Daniel de Faria
Sócio-diretor de Tributos do Grupo BLB Brasil