Casais que pretendem contrair matrimônio ou firmar união estável se deparam com a necessidade de escolher o tipo de divisão de bens que irão estabelecer na relação. A referida escolha muitas vezes é negligenciada, principalmente em razão da ausência de informações sobre cada um dos regimes de bens trazidos pelo Código Civil. Contudo, é de extrema importância a escolha consciente do casal, sobretudo por ela refletir na partilha dos bens durante e, eventualmente, após a cessação da relação.
O que é regime de bens?
O regime de bens serve, principalmente, para regular as relações patrimoniais do casal ao considerar o patrimônio adquirido anteriormente à relação, assim como aquele adquirido na constância do casamento. No sistema jurídico brasileiro atual, a legislação estabelece quatro diferentes modelos de regime de bens, sendo estes:
Comunhão Universal de Bens
Todo o patrimônio, adquirido antes e durante o casamento, pertence ao casal, bem como os bens futuros, gratuitos ou onerosos irão se comunicar entre o casal, com exceção de eventuais bens doados ou herdados com cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar (art. 1.668, I, do Código Civil).
Comunhão Parcial de Bens
Refere-se à comunicação de bens adquiridos onerosamente, por um ou pelos dois, na constância, ou seja, durante o casamento ou a união estável. Tal modelo também é conhecido como regime convencional de bens, pois o Código Civil institui que, não havendo escolha expressa pelos nubentes do regime de bens, tanto no casamento como na união estável, o da comunhão parcial vigorará.
Separação de Bens
Trata-se de um regime em que não há comunicação de bens entre o casal, tanto do patrimônio anterior ao casamento quanto dos bens futuros adquiridos na constância do casamento ou da união estável. Ainda, há uma vertente da separação de bens, tal qual a separação obrigatória de bens, imposta por meio do art. 1.641 do Código Civil para todo casamento no qual um dos noivos tenha idade igual ou superior a 70 (setenta) anos.
Participação Final nos Aquestos
Este modelo pode ser considerado uma mistura do regime da comunhão parcial de bens com a separação convencional, pois durante o casamento prevalecem as regras de uma separação convencional de bens. No entanto, caso o casamento chegue ao fim, seja por meio de divórcio, seja por falecimento, haverá uma espécie de segunda fase do regime, caracterizada pela comunhão parcial de bens.
É possível o casal optar por um regime de bens misto?
A resposta para tal questionamento é facilmente encontrada no art. 1.639 do Código Civil: “É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.”
Contudo, a interpretação desse dispositivo deve ser feita com cautela, uma vez que não se trata de um quinto regime de bens. Na realidade, refere-se à licitude dada ao casal para celebrar, anteriormente ao casamento ou à união estável, um pacto antenupcial quanto aos bens que lhes aprouver.
Sendo assim, é permitido ao casal, por meio do pacto antenupcial anterior ao casamento ou à formalização da união estável, estipular o regime de bens híbrido ou o regime de bens misto, resultando em uma mistura de regimes. Ou seja, o casal pode escolher um regime de bens, mas acrescentar disposições de outro para determinar questões sobre o patrimônio caso ocorra uma eventual separação.
Como exemplo, citamos os casos em que o regime de bens adotado é o da comunhão parcial de bens, mas define-se que determinados bens são de propriedade exclusiva de um dos cônjuges. Isso pode incluir, por exemplo, uma sociedade na qual um dos cônjuges figure como sócio, de modo que, automaticamente, os eventuais lucros provenientes de tal negócio não poderão ser objeto de partilha em caso de separação.
Quais são os benefícios do regime da separação total de bens?
Ao escolher o regime da separação total de bens, o casal opta por uma possibilidade em que os bens adquiridos antes e durante a constância do casamento não se comunicarão. Mas o que isso quer dizer na prática?
Haverá a promoção da separação patrimonial absoluta, de forma que os bens do casal não irão se comunicar. Desta forma, ambos terão plena liberdade para administrar e dispor de seus bens, não sendo necessária, inclusive, a autorização do outro cônjuge (conhecida também como “outorga conjugal” ou “outorga uxória”) quando da eventual alienação de bens.
Em relação às obrigações assumidas, o mesmo raciocínio é aplicado, pois cada um dos cônjuges será responsável pelas dívidas que contrair, sem que isso interfira na esfera patrimonial do outro cônjuge. Essa abordagem também representa, portanto, uma forma de proteção do patrimônio familiar em relação a um cônjuge que exerça, por exemplo, determinada atividade que possa criar riscos ao patrimônio familiar, caso não houvesse a referida segregação.
Ainda, mesmo que o regime da separação total de bens traga essa separação patrimonial entre o casal, é possível que ambos adquiram bens conjuntamente. Em casos como esses, contudo, a aquisição conjunta do casal seria entendida como apenas um condomínio do bem, e não a comunhão de bens decorrente do casamento ou da união estável.
Posto isto, o regime da separação total de bens apresenta-se como uma ferramenta para a proteção de bens individuais de cada um dos cônjuges. Assim, caso uma das partes envolvidas possua bens valiosos ou até mesmo uma sociedade, não precisará se preocupar em dividir esses ativos com seu ex-cônjuge em uma eventual separação.
Qual é a diferença entre regime de bens e direito à herança?
Ao escolher um regime de bens para a administração dos bens durante o matrimônio ou a união estável, conforme mencionado acima, o casal está estabelecendo regras para a sua relação em caso de uma eventual separação. Contudo, caso um dos cônjuges venha a faltar em decorrência de falecimento, as regras aplicadas são diferentes, tendo o cônjuge sobrevivente direito à herança. Levando isso em consideração, o Código Civil, em seu art. 1.789, dispõe que “aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.
Nesse estágio, é necessário diferenciar a sucessão e, consequentemente, a herança do regime de bens. Com o falecimento de um dos cônjuges cujo relacionamento estava pautado no regime da separação total de bens, o seu companheiro se torna herdeiro necessário, em conjunto com os descendentes e ascendentes do falecido, se existentes (art. 1.845 do Código Civil). Caso o cônjuge falecido não tenha deixado testamento dispondo, de forma diversa, em relação aos 50% (cinquenta por cento) do patrimônio não resguardado pelo sistema jurídico brasileiro aos herdeiros necessários ou à “legítima”, o cônjuge sobrevivente será o único herdeiro considerado necessário. Isso ocorrerá mesmo no caso de o falecido ter irmãos, pois o Código Civil define como herdeiros colaterais irmãos, tios e sobrinhos, sendo que esses entes não compõem a legítima. Tal lógica também se aplica ao companheiro(a), pois o Recurso Extraordinário nº 646.721 equiparou-o ao cônjuge em todos os efeitos da sucessão.
Sendo assim, tendo em vista todos os tópicos abordados neste artigo, a escolha do regime de bens entre os casais nos dias atuais deve ser feita de maneira a melhor se adequar à sua realidade, aos bens de ambos e à forma como desejam administrá-los durante o matrimônio ou a união estável. Por fim, a consulta de um advogado especializado em direito de família pode contribuir para o esclarecimento de todas as dúvidas e na deliberação quanto ao melhor regime, contribuindo para uma vida a dois muito mais transparente e tranquila.
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Autoria de Gabriela Borges e revisão de Liz Azevedo
Consultoria Societária e Patrimonial
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