Por que um pronunciamento contábil específico para entidades em liquidação?
Os pronunciamentos contábeis emitidos pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e as IFRS, emitidas pelo IASB, estão orientados primordialmente para as entidades que operam o pressuposto da continuidade.
Quando as demonstrações contábeis não forem elaboradas no pressuposto da continuidade, as normas IFRS mencionam que o fato da não continuidade deve ser divulgado, assim como as novas bases de mensuração.
Todavia, não existe uma norma IFRS específica para essas “novas bases de mensuração” e, consequentemente, o que pode ocorrer na prática é que uma diversidade de práticas entre as entidades que ingressam em regime de não continuidade normal de atividades.
Nesse sentido, de forma a preencher essa lacuna normativa e, sobretudo, tentar obter uma desejada uniformidade na aplicação das práticas contábeis, o CPC entendeu por necessário dar uma resposta a essa questão em particular, por meio de uma norma específica para entidades em liquidação, que indique as bases pelas quais suas demonstrações contábeis devem ser elaboradas.
Por que um novo padrão de prática contábil?
Conforme vimos anteriormente, as normas IFRS são orientadas para o pressuposto da continuidade de uma entidade. Sendo assim, considerando a inexistência de norma específica emitida pelo IASB para a elaboração do pronunciamento em discussão, foi tomado como ponto de partida alguns conceitos da norma específica emitida pelo FASB (Presentation of Financial Statements – Topic 205 – Liquidation Basis of Accounting), órgão normatizador norte-americano.
Em outras palavras, o pronunciamento “CPC Liquidação – Entidades em liquidação” está baseado na norma específica emitida pelo FASB e complementada por itens que constam das normas IFRS/CPCs de forma a procurar alcançar uma desejada uniformidade em relação às entidades em liquidação.
Por esse motivo, o entendimento do CPC é que, com isso, se está introduzindo um padrão novo em relação às atuais práticas contábeis adotadas no Brasil.
Quais entidades devem adotar o pronunciamento Entidades em Liquidação?
O pronunciamento deve ser adotado por toda entidade em liquidação. Contudo, o pronunciamento em questão:
- Não se aplica às entidades cuja liquidação esteja prevista em seus documentos constitutivos; e
- Não se aplica em sua integralidade à entidade submetida a órgão regulador próprio que tenha critérios e procedimentos específicos para essa situação.
Como reconhecer e mensurar os ativos e passivos?
De maneira geral, na data do início do processo de liquidação, a entidade deve inventariar os ativos e passivos conhecidos e mensuráveis, com base no respectivo pronunciamento, cujos reconhecimentos e mensurações veremos abaixo.
Na impossibilidade de estarem todos os ativos e passivos, tal fato deve ser claramente divulgado nas notas explicativas.
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Reconhecimento e mensuração dos ativos:
Os ativos devem ser reconhecidos quando houver razoável segurança de que ocorrerá venda ou realização para pagamento de passivos.
Ativos que não apresentem razoável segurança quanto à sua venda ou realização devem ser divulgados em nota explicativa.
Dado que as entidades em liquidação devem elaborar suas demonstrações contábeis no pressuposto da não continuidade operacional, os ativos devem ser mensurados conforme a seguinte ordem de critérios:
Observações:
- O valor justo é calculado, líquido das despesas de venda. As métricas de mensuração do valor justo são aquelas constantes no pronunciamento técnico CPC 46 – Mensuração do Valor Justo.
- O custo histórico considera eventuais perdas por recuperabilidade.
- Quando os ativos não forem mensurados pelo valor de liquidação, as justificativas para adoção de outro critério devem ser divulgadas nas notas explicativas.
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Reconhecimento e mensuração dos passivos:
Os passivos líquidos deverão ser mensurados pelos valores formal e legalmente devidos.
As provisões deverão ser mensuradas com base na melhor estimativa de saída de recursos para liquidar a obrigação presente.
Um ponto muito importante, diferentemente do exigido pelo pronunciamento técnico CPC 25 – Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes:
- As Provisões deverão ser reconhecidas quando a probabilidade de saída de ativos para sua liquidação seja considerada possível ou provável.
- Os Passivos Contingentes não serão reconhecidos, todavia, sempre deverão ser divulgados em notas explicativas, independentemente de serem provisões sem possibilidade de mensuração de forma objetiva, provisões cuja saída de recursos para sua liquidação seja considerada remota ou passivos dependentes de eventos futuros com alguma possibilidade de ocorrência.
O passivo deve ser reconhecido com todos os custos e despesas, líquidas de eventuais receitas, que espera incorrer até o final de sua liquidação, incluindo-se gastos com advocacia e administração.
Divulgações
Além das Notas Explicativas, as demonstrações exigidas para as entidades em liquidação são:
Tipo de demonstração |
Observação |
DAL:
Demonstração dos Ativos Líquidos
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Esta demonstração contábil apresenta os ativos e os passivos da entidade, bem como seus ativos líquidos positivos ou negativos.
A primeira demonstração do período trata-se do inventário inicial dos saldos dos ativos e passivos da empresa. |
DMAL:
Demonstração das Mutações dos Ativos Líquidos
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Apresenta as mutações dos ativos e passivos da entidade, bem como de seus ativos líquidos. Esta demonstração lembra uma DRE (Demonstração do Resultado do Exercício), contudo, ela é mais detalhada e, podemos considerar (grosseiramente) uma DRE combinada com uma Mutação do Patrimônio Líquido. |
DFC:
Demonstração dos Fluxos de Caixa |
Esta demonstração não se confunde com a demonstração prevista no “Pronunciamento Técnico CPC 03 – Demonstração dos Fluxos de Caixa” e deve apresentar, entre outros itens, os ingressos pela realização de ativos e as liquidações de passivos sempre pelo método direto. |
DML:
Demonstração da Moeda de Liquidação |
Esta demonstração evidencia a relação percentual entre os ativos e os passivos por classe de ativos. Todos os rateios realizados devem ser divulgados ao longo do processo de liquidação de forma cumulativa. |
Conclusão
Vimos que o pronunciamento “CPC Liquidação” está baseado na norma emitida pelo FASB e complementada por itens que constam das normas IFRS/CPCs.
As finalidades do pronunciamento CPC são:
- Suprir a lacuna normativa para entidades que deixem de estar em continuidade;
- Auxiliar a administração a uma prestação de contas com informações relevantes para seus usuários;
- Definir critérios de mensuração de ativos que evidenciam valores mais próximos com o que se espera obter com suas liquidações; e
- Harmonizar as práticas entre as entidades que ingressam em regime de não continuidade normal de atividades.
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Remerson Galindo de Souza
Sócio-gerente de Auditoria Independente do Grupo BLB Brasil