No dia 9 de janeiro deste ano, o CONFAZ publicou o despacho ICMS nº2, que suspende os efeitos de dez cláusulas do convênio ICMS nº 52/2017. Tal ação vem atender a medida cautelar determinada pela presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministra Cármen Lúcia, na ADI nº 5866.
O pedido de inconstitucionalidade foi proposto pela Confederação Nacional da indústria – CNI, alegando em muitos pontos que o convênio gera instabilidade no mercado e que certas mudanças só poderiam ser realizadas por meio de Lei Complementar, como manda nossa constituição.
A suspensão retira os efeitos das cláusulas 8ª, 9ª, 10ª, 11ª, 12ª, 13ª, 14ª, 16ª, 24ª e 26ª, que entraram em vigor em 1º de janeiro de 2018, e passariam a dispor sobre novas regras da substituição tributária e da antecipação do ICMS com encerramento da tributação, revogando os convênios anteriores.
Dentre o pedido que suspendeu as cláusulas supracitadas, a CNI questionou a abertura que o convênio deu para os estados criarem outra maneira de fixação de margem de valor agregado e preço máximo e também a impossibilidade de compensação do ICMS próprio com o ICMS substituído, sendo que os dois impostos são da mesma natureza.
O principal ponto da suspensão se perfaz nas cláusulas 12ª, 13ª, 14ª, que implementam a majoração do diferencial de alíquotas interestadual, o que ocorre similarmente às operações com recolhimento do ICMS-ST para produtos que serão revendidos pelos destinatários em operações interestaduais. Para entender melhor essa regra trazida pelo novo convênio, vejamos sua evolução.
Com o advento do convênio ICMS nº 92/2015, o CONFAZ trouxe grandes modificações ao uniformizar a sistemática da substituição tributária. Em síntese, o convênio uniformizou um rol de segmentos e produtos para os quais os estados podem instituir a cobrança do recolhimento antecipado do ICMS.
Com a evolução dessa norma, em abril de 2017 foi publicado o convênio nº 52 vindo para reforçar o convênio nº 92 e também alinhar as regras da substituição tributária. Como consequência prática, a maioria das cláusulas já estava prevista em convênios anteriores. A grande novidade trazida pelo convênio 52/2017 foi a inclusão do diferencial de alíquotas da operação na própria base de cálculo, acarretando a majoração do imposto. Essa novidade o mercado convencionou a chamar de “base dupla”.
A aplicação da base dupla, em síntese, ocorre nas operações que destinem mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária para contribuinte situado em outro estado com o qual o estado de origem tenha protocolo, e que a mercadoria seja destinada para consumo ou ativo imobilizado do adquirente.
Nessa situação, tendo em vista que a mercadoria é destinada ao consumidor final, não há o que se falar em substituição tributária calculada com índice de valor agregado. Por outro lado, o remente da mercadoria deverá recolher o diferencial de alíquota que seria de responsabilidade do destinatário, e é justamente no cálculo desse diferencial de alíquotas que ocorre a chamada a “base dupla”.
Isso porque, segundo a regra estabelecida no convênio 52/2017, a formação da base de cálculo do ICMS-ST DIFAL será: (i) o valor da operação (ii) deduzido do valor o ICMS operação própria (iii) e somado o percentual de ICMS da operação interna da UF de destino. Para melhor entendimento, abaixo há o exemplo da nova base de cálculo colocada pelo convênio ICMS n° 52/2017.
Diferencial de alíquotas até 2017 |
|
Valor Mercadoria | R$ 850,00 |
Valor IPI | R$ 85,00 |
Valor Frete | R$ 65,00 |
Total operação | R$ 1.000,00 |
ICMS (Alíquota interestadual 12%) | R$ 120,00 |
Alíquota interna Destino 18% | R$ 180,00 |
Diferencial de alíquota (12% – 18%) | R$ 60,00 |
Total Nota Fiscal | R$ 1.060,00 |
Novo cálculo Diferencial de alíquota a partir 2018 |
|
Valor Mercadoria | R$ 850,00 |
Valor IPI | R$ 85,00 |
Valor Frete | R$ 65,00 |
Total operação | R$ 1.000,00 |
ICMS (Alíquota interestadual 12%) | R$ 120,00 |
Cálculo DIFAL-ST – Conv. 52/2017 |
|
Valor da operação sem ICMS | R$ 880,00 |
Aplicar Alíquota Interna destino 18% (R$880,00/0,82) | R$ 1.073,17 |
ICMS sobre a base de cálculo diferencia de alíquota | R$ 193,17 |
Diferencial de alíquota (120,00 – 193,17) | R$ 73,17 |
Total Nota Fiscal | R$ 1.073,17 |
Partindo das operações mais comuns, usando como exemplo a alíquota interna 18% para o estado de destino, a majoração na base de cálculo para fins de aplicar a alíquota do destino é de 7,31% para operações interestaduais com alíquota de 12%, de 13,41% para as operações interestaduais com alíquota de 7%, e de 17,07 % para operações com produtos importados, cuja alíquota interestadual é 4%.
A arrecadação do ICMS-ST observando às particularidades de cada estado, continua do mesmo modo, seja para os casos de o destinatário revender ou não. Via de regra, será recolhida uma “GNRE” para o estado de destino na saída da mercadoria, ou o contribuinte poderá se cadastrar nos estados que praticam operações, para recolher o ICMS-ST por apuração mensal, com data de vencimento prevista para dia 9 no mês subsequente.
O novo convênio dispõe ainda da forma de ressarcimento do imposto quando já retido em operações anteriores ou no desfazimento do negócio (devolução). A metodologia sugerida para essa situação é a emissão de uma nota fiscal exclusiva para o ressarcimento do ICMS destacado por substituição, podendo utilizar o crédito da nota para deduzir apenas o ICMS-ST. Essa cláusula também foi alvejada pelo pedido da CNI de suspensão, alegando que o ICMS e o ICMS-ST não são impostos distintos.
O pedido de inconstitucionalidade instaurado pela CNI afirma que essa majoração se trata de bitributação e consequentemente teria reflexo nos preços impactando negativamente na produção e venda de vários setores. Vale lembrar que o pedido incluía a tentativa de suspender as cláusulas 3ª e 27º, que não foi atendida pelo STF.
Para os empresários a suspensão é benéfica, visto que essas cláusulas oferecem menor competitividade para as vendas fora do estado. Pensando que estamos na era digital, com uma forte tendência do e-commerce (mercado virtual), que quebra as fronteiras para buscar produtos, a investida da nova base de cálculo impactaria nos preços, tornando para o consumidor mais atraente em muitos dos casos, a aquisição do produto no próprio estado.
O convênio ICMS 52/2017 revogou os antigos convênios que dispunham sobre a substituição tributária, tais como: Convênio nº 81/93: regras gerais aplicáveis ao ICMS-ST; Convênio nº 70/97: definição da base de cálculo do ICMS-ST; Convênio nº 35/11: vedação à aplicação da margem de valor agregada ajustada para SN; Convênio nº 92/15: unificação das mercadorias sujeitas ao ICMS-ST; Convênio nº 149/15: conceituação e regras relativas às mercadorias produzidas em escala industrial não relevante.
Mas com a suspensão os convênios antigos ainda continuam a produzir os seus efeitos, sendo inaplicável a base dupla e as demais regras no presente momento. A análise final do pedido de inconstitucionalidade será concluída pelo STF, que acabou de voltar do recesso parlamentar. Diante de mais esse empasse jurídico/tributário, o contribuinte terá a árdua missão de definir sobre a aplicação ou não do convênio 52/2017 até a definição final.
Paulo Martesi
Trainee da Divisão de Tributos
BLB Auditores e Consultores