Como forma de otimizar o pagamento das dívidas tributárias, foi instituída a Portaria nº 742 de dezembro de 2018, que possui a finalidade de regulamentar o Negócio Jurídico Processual (NPJ), figura presente a partir do Código de Processo Civil (CPC) de 2015.
A Portaria estabelece as regras para a realização dos acordos entre contribuinte e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Cumpre esclarecer que esses acordos são realizados em sede de execução fiscal, ou seja, é o processo que garante ao governo o pagamento de uma dívida tributária. Nesse sentido, para que seja cobrado o débito, é necessário um título executivo como formalização da dívida que, no caso em tela, é chamada de certidão da dívida ativa.
Então, a Portaria visa facilitar os procedimentos para o pagamento de dívidas, como forma de beneficiar reciprocamente as partes envolvidas. Dessa forma, a norma estabelece as maneiras como o litígio processual será resolvido.
No ano de 2018 foram publicadas duas Portarias: a Portaria 360/2018 e a Portaria 515/2018. A primeira autoriza o Negócio Jurídico Processual, em se tratando do cumprimento de decisões judiciais, confecção e conferência de cálculos, recursos e desistências e a forma de inclusão do crédito fiscal e FGTS em quadro geral de credores. Já a Portaria 515 regulamenta as práticas quando a União é devedora.
Consoante com a Portaria 742, é objeto de Negócio Jurídico Processual a calendarização da execução fiscal; o plano de amortização do débito fiscal; aceitação, avaliação, substituição e liberação de garantias; o modo de constrição ou alienação de bens.
Cumpre lembrar que estão inclusas as empresas em recuperação judicial, em que a lei exigia a apresentação da certidão de regularidade fiscal para que pudessem entrar nesse regime. No entanto, a jurisprudência do STJ, em alguns casos, já se posicionou em sentido contrário, levando à inclusão dessas empresas na Portaria.
Assim, o contribuinte que tiver o interesse de celebrar o Negócio Jurídico Processual, o fará por meio de solicitação, que será analisada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
Para que haja a solicitação do Negócio Jurídico Processual, um dos requisitos inclui informar a relação de bens particulares do contribuinte, com a respectiva localização, destinação e o valor atual de mercado.
O patrimônio pessoal do contribuinte poderá ser afetado?
Em regra, não. Cada empresa possui a constituição da sociedade em formas diferentes, como, por exemplo, EIRELI, Limitada, entre outros. A segurança jurídica trazida na constituição de cada sociedade representa a maneira como será a sua responsabilidade no caso de inadimplemento. Em outras palavras, um empresário individual possui responsabilidade ilimitada, ou seja, a depender do caso, poderá responder com os bens da pessoa física. O que não ocorre com a sociedade limitada, por exemplo, em que a responsabilidade é limitada ao capital social da empresa, não transferindo para a pessoa física.
Porém, há exceções. De acordo com expressa determinação do artigo 135 do Código Tributário Nacional, a responsabilidade da pessoa física é atingida quando os sócios agirem com excesso de poderes ou infração à lei. Assim, o mero inadimplemento da obrigação tributária não estende a responsabilidade aos sócios em relação aos bens particulares.
Destarte, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se posicionou sobre o assunto com a Súmula 430:
“O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.”
Ademais, importante salientar que, tratando-se de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial, o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica no processo, possibilidade que afeta o patrimônio particular do contribuinte.
Também há outra possibilidade de os bens dos sócios serem atingidos, mas em relação à garantia. Assim, no caso de o devedor oferecer como garantia um bem particular, haverá possibilidade de execução.
Seria uma espécie de fiança, em que a pessoa física, neste caso, não atuaria como responsável, mas sim, como fiadora. Portanto, não se refere a uma transferência de responsabilidade por inadimplemento da obrigação por parte da pessoa jurídica, pois é uma forma de atingir o fiador, ou seja, aquele que afiançou a dívida.
Nesse sentido, apresentamos situações diferentes. Em relação à garantia, a pessoa física oferece uma fiança, então, é possível atingir o fiador, independentemente da responsabilização da pessoa física.
Ao passo que, é possível atingir os sócios, em uma eventual transferência de responsabilidade da pessoa física pela pessoa jurídica por débito da pessoa jurídica, em se tratando de fraude ou excesso de poder.
Portanto, a finalidade da Portaria é otimizar a recuperação de créditos tributários em forma de acordo, de uma maneira em que o contribuinte possa se utilizar de um meio menos burocrático para criar um diálogo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, adimplindo os débitos tributários.
Como a Portaria iniciou sua vigência em dezembro de 2018, ainda não há precedentes suficientes para saber de sua efetividade. Assim, é importante que os contribuintes se atentem à possibilidade de utilização do Negócio Jurídico Processual como forma de solução aos litígios em execução fiscal. Também é importante o acompanhamento dos precedentes judiciais em relação ao assunto, como forma de verificar a Portaria sendo aplicada na prática.
Salwa Nessrallah
Consultora Tributária
Grupo BLB Brasil