O CPC 47, correlacionado à Norma Internacional de Contabilidade – IFRS 15, trouxe relevantes mudanças na estrutura contábil das entidades, e não poderia ser diferente, já que a nova norma estabelece o tratamento destinado às receitas da entidade.
As mudanças não se restringem, contudo, aos aspectos contábeis. Ao mudarmos a forma que uma entidade reconhece uma receita, toda a estrutura empresarial sofre modificações, isso inclui o sistema tributário, contábil, trabalhista, análise de balanços etc.
É preciso considerar que o pronunciamento pode afetar setores completamente independentes, como, aspectos contábeis trabalhistas – por exemplo, se há alteração do momento do reconhecimento da receita, altera-se também o momento de se reconhecer bônus ou comissões.
No presente artigo trataremos essencialmente do impacto tributário na aplicação do CPC 47.
O pronunciamento altera o tratamento tributário de uma entidade?
A primeira pergunta que deve ser feita é se o pronunciamento teria a capacidade de alterar o tratamento tributário de uma entidade a determinado fato gerador. A resposta é não!
A contabilidade segundo os padrões da IFRS 15 visa capturar os fatos econômicos de forma prospectiva, considerando a capacidade da entidade de gerar fluxo de caixa futuro. Por outro lado, o sistema tributário nacional está vinculado com o elemento central da manifestação da riqueza ou, em outras palavras, da manifestação da capacidade contributiva.
Desse modo, enquanto o CPC 47 estabelece uma série de requisitos que ensejam o julgamento quanto ao reconhecimento das obrigações de desempenho, a norma tributária estabelece requisitos muito mais rígidos e objetivos para o reconhecimento de uma receita tributável – ainda que injustos, por diversas vezes.
Assim, por ser uma norma que trata essencialmente de conceitos contábeis e jurídicos, o sistema tributário não permite que essa modificação contábil possa ensejar reflexo na arrecadação tributária. Em outras palavras, a legislação tributária é conceitualmente independente da contabilidade para determinar se determinado fato-acréscimo patrimonial é uma receita para fins fiscais.
A tratativa fica mais evidente quando citado o artigo 58, da Lei 12.973/14:
Art. 58 A modificação ou a adoção de métodos e critérios contábeis, por meio de atos administrativos emitidos com base em competência atribuída em lei comercial, que sejam posteriores à publicação desta Lei, não terá implicação na apuração dos tributos federais até que lei tributária regule a matéria.
A legislação do PIS também reitera tais disposições:
Art. 1º. A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
Conclui-se, portanto, pela neutralidade tributária em relação às alterações promovidas pelo CPC 47. Essa neutralidade possui algumas exceções, porém, de conteúdo formal – não afetando materialmente a tributação.
A instrução normativa 1.771/2017 reitera a neutralidade tributária:
“A pessoa jurídica tributada pelo lucro real que adotar procedimento contábil relacionado nos itens 1 a 3 calculará, para cada operação e em cada período de apuração, a diferença entre a receita que teria sido reconhecida e mensurada conforme a legislação tributária e os critérios contábeis anteriores e a receita reconhecida e mensurada conforme o CPC 47.”
O CPC 47, apesar de reiterar que a divulgação da receita na demonstração do resultado seja feita em conformidade com o pronunciamento, determina que a entidade faça uso de outras contas de controle interno a fim de realizar uma conciliação entre os valores registrados para finalidades fiscais e os evidenciados como receita para fins contábeis, divulgando tal conciliação em nota explicativa às demonstrações contábeis.”
O pronunciamento é irrelevante tributariamente?
Considerando o questionamento do tópico anterior, é preciso que seja respondida uma segunda pergunta: o CPC 47 é irrelevante tributariamente? A resposta também é não!
Isso ocorre porque os efeitos da divergência entre a contabilidade e o direito tributário necessitam ser controlados pela entidade. Ou seja, como o CPC 47 altera de forma profunda a estrutura contábil da entidade no reconhecimento de receita, para que seja possível a aplicação da neutralidade tributária é preciso que o sistema de informação da entidade esteja corretamente parametrizado.
Além disso, conforme já exposto, o CPC 47 determina que a entidade faça a conciliação entre a divergência contábil e tributária em notas explicativas, o que exige instrumentos comparativos e transparentes entre o reconhecimento contábil e tributário.
Por fim, embora não tenha efeito direto na arrecadação tributária, os conceitos contábeis do CPC 47 corretamente aplicados indicam à autoridade fiscal uma contabilidade transparente e com poucos indícios de fraude ou omissão de receita.
Conclusão
Ainda que não altere o recolhimento tributário – tendo em vista a neutralização tributária –, o CPC 47 precisa ser observado e parametrizado no sistema de informação da entidade, vinculado aos parâmetros tributários, a fim de permitir a conciliação da divergência entre o reconhecimento de receita contábil e tributário.
Sendo assim, o sistema de informação da entidade passará a apurar a receita sobre dois critérios distintos, um critério fiscal e outro critério de acordo com o CPC 47.
O Grupo BLB possui uma equipe hábil a desenvolver a parametrização dos sistemas tributários e contábeis da entidade, permitindo o cumprimento tanto da norma tributária como das exigências das normas contábeis, inclusive do CPC 47 e da IFRS 15.
Gabriel Tavares
Graduado em Direito pelas Faculdades COC, pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).
Leia mais artigos sobre as normas CPC 47 e IFRS 15:
– CPC 47 e IFRS 15: aspectos introdutórios e conceituais
– CPC 47 e IFRS 15: como e quando uma entidade poderá reconhecer uma receita?